Fotografia de Pierre Poulain / www.photos-art.org

Este texto de José Carlos Fernández foi inspirado na fotografia acima de Pierre Poulain, fazendo parte de um projeto intitulado FiloFoto.

Como uma sombra que passa, assim é a vida, assim é o tempo, assim é tudo quanto a nós chega, pois da mesma forma que vem, vai. Como disse um profeta: se permaneces vigilante, ou seja, se é Deus quem olha em ti, verás até as firmes montanhas, estáveis e permanentes, desfazerem-se como sombras na planície. E, porém, no jogo da vida o encontro de um ser humano com outro, sem importar a raça, o credo, a condição social, é sagrado; e desde o berço à tumba vamos sempre acompanhados, dos nossos pais, filhos, amigos, sócios e dessa rede de vínculos nasce a natural felicidade; e nada somos sem o outro; e o solitário vínculo com o Amigo Imortal que vive em nós é essencial, mas insuficiente salvo para almas excelsas.

Mas o que vemos hoje é que os monstros da nossa imaginação, vivificados pela tecnologia pujante e omnipresente, converteram-se no mundo que nos rodeia; onde o ser humano já não é o mais importante, pois a máquina substituiu-o. Como dizia o professor Jorge Angel Livraga (m. em 1991) desenhamos as máquinas e depois as máquinas desenham novos tipos humanos, que adaptem a elas as suas potências vitais e anímicas. Agora elas não são somente cenário, luzes de ribalta, atrativo principal, relógio que marca o ritmo da nossa existência; pouco a pouco convertem-se na própria personagem, e o ser humano, despojado, converte-se – num sentido menos filosófico, mais obscuro e vago – numa sombra que passa, perdendo-se a si mesmo e sem reconhecer o outro, verdadeiro espelho da nossa alma.

Como sombras que passam, vamos empurrados pelas rodas dentadas de um mundo que desenhámos com otimismo mas que agora nos é alheio, pois não nos deu a paz que prometia nem iluminou as nossas sendas com a sonhada felicidade.

Como sombras que passam, vamos carregados com as nossas recordações e experiências, que deveriam alimentar-nos e, em vez de isso, arrastamo-las. Como sombras que passam, é-nos difícil erguer, lançar um grito de desafio ao horizonte e avançar até onde realmente queremos chegar, em vez de dar voltas e voltas no ventre da baleia de Jonas deste mundo máquina.