Tudo vibra. Todo o Universo está em movimento.
Embora levados pela ilusão de Maya, às vezes acreditamos sentir quietude e falta de movimento, mas tudo o que está manifestado participa desta lei da ação.
Já vimos que, sabiamente disposto por Maya, cada degrau da Natureza é afetado por uma particular forma de movimento. A terra move-se sobre si mesma, ao redor do Sol, dentro da galáxia; e milhares de movimentos afetam-na no seu próprio coração de planeta. A água, o ar e o fogo movem-se na Terra, correndo, soprando, queimando… e movem-se nos seus mundos especiais de vida, emoção e mente.
As pedras movem-se resistindo ao movimento, e no limite das suas forças, dilatando-se e contraindo-se. As plantas movem-se crescendo, os animais fazem-no sentindo; e os homens demonstram uma ação onde se conjuga a resistência da pedra, o crescimento da planta, a emotividade do animal e o raciocínio exclusivamente humano.
Se chegarmos a conceber a existência sobreposta e combinada de todos estes mundos, veremos que a matéria parada não significa falta de movimento. Podemos estar tranquilamente sentados, que não pára a respiração, nem a circulação do sangue, nem a continuidade de muitas outras funções vitais; e tampouco não deixamos de continuar a viver as nossas emoções e os nossos pensamentos. Onde está a quietude? Onde está a atividade?
O que é este movimento que afeta todo o Universo?
É, simplesmente, falta de equilíbrio. Todo o movimento não é mais que a procura declarada do equilíbrio que falta. Todas as coisas vivas movem-se porque necessitam desse equilíbrio, dessa harmonia ausente, de um destino final onde o repouso não seja inércia, mas a soma estabilizada de todos os movimentos.
Em busca de equilíbrio, os seres vivos estão em perpétuo movimento, experimentando os mais variados caminhos, e oferecendo a olhos externos a própria imagem da instabilidade, da falta de sentido, da desordem total.

Caminhos diferentes. Pixnio
As coisas vão e vêm, nascem e morrem, aparecem e desaparecem, triunfam ou fracassam, levadas por um instinto que, embora aparentemente não acerte a direção correta, sabe com certeza qual é a meta final. É por isso que somos confrontados face a movimentos corretos e movimentos incorretos; os primeiros são os que nos aproximam da meta, e os segundos afastam-nos dela através do erro.
Maya participa ativamente neste jogo, sobretudo se as metas lhe são diretamente propícias, ou seja, se as finalidades se centram no triunfo e multiplicação da vida material. Maya não pode brincar – e não o faz – com as coisas da alma.
E, portanto, a jogar com a vida, Maya deleita-nos com sentimentos de satisfação quando acertamos com alguns dos seus caminhos, e castiga-nos com a sensação de dor quando nos afastamos por ignorância da senda traçada. Mas Maya não deleita nem castiga, simplesmente cega quando o homem ousado, tendo sabido dos caminhos da terra, tenta conhecer os outros que lhe abrirão as portas do espírito. Portanto, não se trata apenas de encontrar o verdadeiro caminho, mas de o encontrar apesar dos véus de Maya.
Mas, num ou noutro caso, o movimento nunca cessa. Se cometemos um erro, há boas razões para que novos movimentos nos afastem do erro. E se acertamos, o movimento continuará em função de novos acertos que devemos alcançar.
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O que os homens chamam de ação é a plasmação direta do movimento. A ação é o movimento com finalidade – como todos os movimentos – e ordenado com base nesse mesmo objetivo; é um movimento intencional – como todos os movimentos –, mas com consciência dessa intencionalidade.
Quando o corpo se move instintivamente, simplesmente se move; mas se canaliza o movimento conscientemente, compreendendo a sua razão de ser, então atua. A ação é, assim, própria do homem consciente e, em planos inferiores ou superiores ao homem, é própria de uma raiz pensante e inteligente, quer a encontremos nos animais ou nas estrelas.
Todas as formas de vida, em maior ou menor medida, participam da ação. Atua a pedra com a sua obscura faísca de consciência; atua a planta quando entra em contacto com a Natureza e se deixa beijar pela água e pelo vento, ou se deixa acariciar pelas palavras humanas de alento, ou pelo encantador gorjeio dos pássaros. Atuam os animais quando seguem as leis da espécie, quando ouvem a voz da sobrevivência, quando – já domesticados – reconhecem e seguem a voz de um dono.
Também atuam os homens quando conseguem, por fim, diferenciar-se dos minerais, vegetais e animais. Fazem-no quando deixam prevalecer os seus dons puramente humanos e quando a consciência sabe que é impossível fugir à ação, já que todo o universo está afetado por esta vibração de crescimento e procura de equilíbrio.

Investigación. Creative Commons
Duas coisas se devem compreender, sem se deixar apanhar pelos jogos de Maya. Uma delas é que nada nem ninguém pode negligenciar a sua quota parte de ação; o movimento inconsciente está dado pela própria existência, mas a ação é o que contribui a maiores graus de evolução. Se todo o mundo se move, o que tenta não se mover contradiz as leis universais, pelo que somente desastres lhe podem suceder. Estar parado não é deixar de agir: é agir mal e de forma deficiente. Não agir é convidar os outros para que cumpram as nossas funções na máquina perfeitamente programada do cosmos; e isso, segundo os velhos livros sagrados, é pior que ser um ladrão.
A outra coisa que compete à ação também está ligada com a sabedoria tradicional. Nem todas as ações – mesmo que conscientes – têm a mesma qualidade. A melhor ação é a reta ação, aquela que se realiza sem intenção de prémio ou recompensa, ainda que Maya se encarregue de premiar ou castigar todas as ações realizadas.
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A ação consciente é sinónimo de compromisso. Todos os seres vivos, conforme permitem que os seus princípios internos vibrem, comprometem-se com a própria vida, com a própria evolução, com o destino, com as consequências de toda realização. Ação é compromisso, e compromisso é uma forma superior de consciência: aquele que não tenta fugir às suas próprias responsabilidades.
A ação consciente é contrária a todos os traços de cobardia, pelo próprio facto de que implica o compromisso e a aceitação responsável das consequências. O cobarde não atua: “deixa-se atuar” levado pelas obscuras forças do medo.
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Quando o movimento primordial e a ação são objetivadas no mundo concreto, encontrámos a fórmula do trabalho. Trata-se de muitas ações consecutivas e relacionadas, sejam estas materiais, psíquicas ou mentais, que levam à obtenção de um fim da maneira mais correta possível.
O trabalho é uma das fórmulas ideais do movimento e, portanto, da realização do equilíbrio. Cada vez que um objeto, uma tarefa, um objetivo, ficam bem terminados e resolvidos, o homem vislumbra, em alguma medida, a resolução do equilíbrio final para o qual se dirige. Converte-se num excelente incentivo para atrever-se a consecuções cada vez maiores, e a resultados cada vez melhores.
Será que Maya não trabalha quando joga?
Delia Steinberg Guzmán
Extraído do livro Os Jogos de Maya. Editorial Nova Acrópole
Imagem de destaque: Movimento. Creative Commons