Fotografia de Pierre Poulain / www.photos-art.org

Este texto de José Carlos Fernández foi inspirado na fotografia acima de Pierre Poulain, fazendo parte de um projeto intitulado FiloFoto.

Atrás dos vidros, uma presença que não espera, que passa. Uma presença que quando queremos olhá-la fixamente, se nos descuidamos, já não está. Assim somos tu, eu, ele; assim somos nós, uma luz e uma expressão por detrás da máscara. Mas uma luz e uma expressão que passam, e se não aproveitas a oportunidade, que é sempre um dom de Deus, passa. E o momento fugidio, essa porta ou janela para chegar ao coração da realidade, ou para nos aproximarmos um passo mais a ela, fecha-se. E de novo a prosa do quotidiano, o insosso do repetido e sem graça, a ausência do real por detrás dos véus, das máscaras, dos vidros; martiriza-nos com o peso na consciência do instante que não aproveitámos, da oportunidade perdida.

Carpe diem, “agarra o dia”, faz que seja teu, possui-o, entra nele com toda a alma. Sai dele com a plenitude da obra realizada. Carpe diem, faz tua a oportunidade, disseram os clássicos romanos. Detrás de sete véus resplandece a Natureza virgem e não profanada, véus de aparências cada vez mais densas, até ao último que é percebido com os sentidos físicos: isto ensinaram os sábios herméticos. Mas detrás destes véus – como na dança de Ishtar quando esta Deusa do Amor e da Guerra descende ao inferno procurando o seu amado Dummuzi – a vida dança, está em movimento, a sua beleza perfeita não espera o fim de um raciocínio, só o olhar da alma pode chegar a ela, pura e desnuda como ela.

Como um jogo de espelhos é o labirinto que confunde o peregrino que nele entrou, e neste jogo confundimos o real com a sua imagem, e o original com a cópia, e o criativo com o repetitivo… e assim nos perdemos. E aquele que vê a sua imagem em mil espelhos do labirinto sente a vertigem de não saber exatamente onde está, nem quem é ele: pois os espelhos não só devolvem a imagem, também a deformam. E no entanto, por trás de todos eles, despreocupado, vivendo um tempo que para nós é eternidade, irresponsável das imagens que projeta, pois nunca é filho das consequências, e sempre causa de tudo: está o Real. E o Real não te espera na tua perturbação, não é cúmplice dos teus medos, desejos ou frustrações, daquilo que te cega ou paralisa: simplesmente ali está, detrás de todas as máscaras, e no que dura um piscar de olhos, ficou fora do teu alcance.