Descrição do mito: ensinamentos esotéricos que inclui

Trata-se de um dos mitos mais importantes da tradição avéstica. Aparece como tal no segundo Fargard de Vendidad Sade, o tratado do Militante. No entanto, ao não incluir um conjunto de preceitos morais, faz pensar os especialistas de que talvez se trate da interpolação de um mito antigo. Da Índia? Referente à humanidade primitiva, aquela que havia antecedido o Dilúvio Universal, o afundamento da Atlântida? As semelhanças com o mito bíblico de Noé ou do sumério Utnapishtin são evidentes.

Neste hino Yima é o primeiro rei, o primeiro homem com que Ormuz, rei dos deuses, teria “conversado”. O primeiro que teria recebido a Lei de Ahura Mazda, a mesma que Zoroastro teria anunciado e içado como estandarte de ideias capaz de transformar a Humanidade sumida no caos da ignorância. Ahura Mazda encarrega Yima de ser o portador de uma “Revelação”, porém este se considera incapaz e aceita somente engendrar criaturas e governá-las com equidade. Compromete-se perante Ahura, “a proteger o mundo, alimentar e velar por ele”, mas não para ensinar, meditar e proclamar a Lei. Recebe de Deus os instrumentos mágicos, uma lança e um anel de ouro. Faz crescer tanto as criaturas na Terra, que esta não é suficiente para contê-las e alimentá-las, e por três vezes ele deve alargá-la com os presentes mágicos de Ormuz. Sobre esta terra renovada alargou a propagação de “gado, animais selvagens, homens, cães, pássaros e fogos vermelhos e ardentes”, até não haver mais sítio para eles e a Terra não poder aumentar mais o seu tamanho. Yima seguindo as instruções de Ormuz, vê-se obrigado a reduzir a superpopulação, fazendo uma seleção dos “germes” dos melhores exemplares. O resto é devastado por intermédio de um cataclismo em que as águas cobrem e dissolvem tudo o que pesava sobre Spendarmat (a Terra). As sementes de homens, animais e fogos são resguardadas num recinto (VARA) em que tudo cresce muito lentamente e os homens se reproduzem a cada 40 anos. Todas as criaturas selecionadas vivem em pares num reino isento de maldade e discórdia, ao abrigo das geladas águas do alto, das perigosas torrentes dos vales e da neve gelada das regiões intermédias. Yima elevou fortes e altas muralhas em torno do recinto sagrado e no seu centro, uma torre com janelas de onde se derrama um divino esplendor. Um pássaro chegado do céu, KARSHIPTA, ensina a Lei de Ahura a todas as criaturas.

Depois desta espécie de Idade de Hibernação, Yima morrerá vítima de AHÍDAHAKA, que com a ajuda de SPITYURA o serrará em dois. Comentários posteriores ao Avesta asseguraram que Yima teria pecado por orgulho.

Iluminura da Épica dos Reis retratando Yima sendo partido ao meio perante Ahídahaka. Domínio Público

Neste mito, como em quase todos os tratados místicos ao alcance popular se fala de  entretecidos ensinamentos muito diversos referentes tanto à história da Humanidade como às leis ocultas que regem a Natureza. Tão entrelaçados que é difícil discernir, separando o que pertence à cosmogonia ou à antropogénese, ou simplesmente, à história dos primeiros povoadores do Irão.

O que sim é evidente é que neste mito se expõem:

  • A passagem da Vaga da Vida através de Globos sucessivos no seio da Terra (ver os esquemas de H.P. Blavatsky na sua Cosmogénese).
  • O comportamento dos Pitris ou ancestrais lunares (de novo segundo os ensinamentos de H.P. Blavatsky) que garantem a segurança da humanidade, para seu crescimento e adaptação às novas possibilidades que a Terra oferece. Que a aconselha e protege na medida suficiente para que se perpetue até ao final do seu Ciclo. A incapacidade dos Pitris de transmitir a chama divina ou Fogo Mental.
  • A história dos iranianos, que deveria ter sobrevivido a uma glaciação, perpetuando os germes físicos e espirituais de uma nova civilização. Os iranianos a que se refere a Doutrina Secreta, não são necessariamente os mesmos que aparecem nos textos de história, embora talvez seus predecessores.
  • A natureza do impulso criador que conserva e faz manifestar-se nos mundos gerados da Eternidade. Yima, como o Logos-Homem criativo que se desenvolve dentro da actuação dos Primeiros Arquétipos (os Números) no seio da Matéria Primordial. Zela e faz crescer “os mundos de Ormuz” graças às ofertas divinas do anel (o zero da Vacuidade pura), e da Lança (o primeiro Uno, o Diâmetro Vertical ou criativo no Círculo).
  • A constituição interna do Homem, habitada por luzes criadas (poderes psíquicos, em relação com os astros) e incriadas (a essência espiritual do ser humano).
  • Mecanismo de sucessão de raças ou humanidades, salvaguardando núcleos ou germes que podem transmutar-se até se converter nas sementes de uma nova Humanidade (como o conceito do Homem Novo das Cartas de São Paulo).

Simbolismo de Yima. Relação do Yima avéstico e do Yama hindu.

Segundo o Vendidad, Yima é o primeiro homem, o melhor, a primeira Humanidade. Segundo H.P.B. se Yima no mito “não nasce” é porque representa as três primeiras raças mãe humanas, a primeira das quais é “não nascida”. Yima, porém, morre despedaçado em dois, porque a terceira raça dividiu-se em sexos e conheceu a morte.. Yima é o “primeiro homem” que morre, a Humanidade que necessita da morte e do renascimento para continuar sua peregrinação nos mundos da forma. Representa também os progenitores espirituais da Humanidade, os Pitris, que projetaram como sombras as suas primeiras formas materiais para dar corpo aos primeiros seres humanos, enteléquias que descreve a Doutrina Secreta e mesmo Dalai Lama em “O Universo em um só átomo.”

Sua relação com Yama hindu, deus da morte e virtuoso rei do tempo primeiro é clara, já que Yima também representa a Humanidade que no seu terceiro estado foi animada por egos superiores, e portanto, teve consciência da morte, do tempo e do que é justo ou não. Assim, se representa Yima pecando de orgulho e perecendo por esta razão. E é o orgulho a sombra que projeta a mente superior sobre as águas barrentas do astral. Sem mente não há orgulho nem maldade, assim como tão pouco capacidade de compreensão e livre obediência.

É símbolo da Humanidade, e por conseguinte, também do seu verdadeiro Rei. Carrega os atributos da soberania, a lança ou agulha de ouro, e o anel, que expressam o impulso criador. A forma do anel e a forma da agulha dizem respeito ao círculo e do seu diâmetro vertical, base geométrica dos números ou primeiros arquétipos. Yima é a imagem do rei justo, do “que está à frente dos homens que se juntam” em torno ao Ideal da Concórdia.

O Ali Dahaka que o parte em dois não deve ser outro que o védico Daksha que procria seres materiais de sexos opostos partindo assim a Humanidade em dois. As referências no livro, Livro dos Reis a um Yima Kshaeta ou Yima luminoso refere-se ao arquétipo da humanidade, ao homem espiritual que guia as transformações do homem de chumbo em homem de ouro.

Yama em seu touro. Domínio Público

Análise dos elementos do mito. Comentários de acordo com as diferentes chaves.

Ahura Mazda outorga “trezentos países” como seu domínio. Devem simbolizar as três humanidades e as múltiplas divisões que se produzem dentro de cada uma delas. Também trezentos como símbolos do triângulo espiritual inferior na matéria. Os alargamentos a que obriga a Terra, ou à multiplicação por três do número de países correspondem à explicação da Doutrina Secreta das Cadeias, Globos e Humanidades ou Raças-Raiz.

Nestas três o impacto ou “golpe” que produz o espírito na matéria vai aumentando, porque o ângulo que forma espírito e matéria é cada vez mais perpendicular. Um sábio o comparou com o som progressivo das teclas do piano em que se pressionam cada vez com mais força. Também aumenta a diversidade de formas até alcançar o seu clímax no Quarto Momento: 4ª Cadeia, 4º Globo, 4ª Humanidade (dentro do diagrama já mencionado). Que as criaturas pesem sobre a Terra, mãe comum, é um tema repetido em distintas mitologias, e em todas elas a solução é sempre um cataclismo devastador: terramotos, glaciações, inundações, impacto de meteoritos, etc.

Difícil é averiguar o significado de “gados, cães, animais selvagens, pássaros, homens e incêndios ardentes”, que habitam a Terra, porém a chave é o Ser Humano, é quem marca a tónica ou diretriz fundamental do comportamento do resto dos seres vivos.

Cada vez que Yima deve ampliar a Terra, “se eleva em direção às estrelas seguindo o curso do meiodia, pela rota que segue o Sol”. Talvez o simbolismo disto seja que como Yima representa o conjunto das Mónadas humanas, indique que entre Globo e Globo ou Cadeia e Cadeia (usamos o esquema teosófico), medeia um intervalo em que a Humanidade se dissipa no Nirvana e as Mónadas, voltam para junto a seus Dhyanis ou Raios espirituais dos quais procedem. Neste momento, diz-se à Terra que “marche em frente, que caminhe de lado de acordo com as suas ordens”, pois cada ciclo de Humanidade implica um movimento da Terra distinto em torno do Sol e variações importantes de seu próprio eixo. É curioso que nos primeiros “momentos” da Terra (leia-se, as primeiras Humanidades) o clima é ameno (é dizer, não há comunicação entre o Homem Interior e o seu invólucro carnal), porém a partir do terceiro “os rigores do inverno podem ferir as criaturas revestidas de um corpo”.

Perante a catástrofe que se avizinha, Yima, como bom pastor, deve dirigir os rebanhos a um lugar seguro. Em toda a tradição indo-ariana o gado representa almas humanas. O perigo não é só físico, mas também moral, que a Água dissolva as ditas almas, as arraste e as congele. Se as deve separar de três sítios: do “cimo das montanhas” do orgulho, onde se podem congelar; da profundeza dos vales, reino das paixões e da sensualidade, de onde podem ser arrastadas; e dos difusos lugares médios da dúvida e da incerteza, onde as almas confundem-se e não são mais reconhecidas. Que magistralmente está descrito neste mito!, onde se insiste “nuvens poderiam cobrir um lugar habitado por seres dotados de corpo, onde não se veem senão os pés tanto do gado maior como do menor”, isto é, apenas o traço confuso das almas é percebido no meio da escuridão dos sentidos.  Fecham-se os sentidos espirituais, tal é a dissolução moral que leva necessariamente a um cataclismo geológico. Também na religião védica aparecem seres de névoa que se apoderam do gado, o mesmo é dizer, das almas, e o herói salvador é aqui Indra, o deus guerreiro por excelência, símbolo dos esforços do Rei do Mundo, para levar a Humanidade ao seu último destino.

“O criador Ahura Mazda conduziu a assembleia com a ajuda dos Yazatas celestes… O brilhante Yima reuniu a assembleia dos homens mais virtuosos… A esta reunião veio o criador Ahura Mazda com os seus Yazatas celestes”.

Yima tinha alargado por três vezes a Terra, e esta não podia dar mais de si, e reunida a Assembleia dos Deuses, presididos por Ahura; e a assembleia dos homens puros, presidida por Yima vai ser criado o Vara ou “recinto sagrado”. Tudo isto, expressa a descida das Mónadas (os deuses ou yazatas) no seio da Terceira Humanidade. A imagem é que ficam alinhados um a um, os homens puros e os deuses: o homem não será jamais uma sombra passiva e inerte, mas um ser consciente, responsável pelos seus atos.

H.P.B. explica que os “yazatas” são os espíritos celestiais puros, a quem o Vendidad apresenta compartilhando o seu alimento com os mortais, que assim participam da sua existência. Este banquete comum de homens e deuses expressa a relação de ambos na mente. Estranha relação em que o homem se diviniza e chega a perceber a sua imortalidade, e na qual os deuses participam, até certo ponto, das paixões dos homens.

Helena Petrovna Blavatsky. Domínio Público

Os yazatas ou veneráveis são os izeds, espíritos que conduzem às regiões celestes os homens puros. Em número de 20, são posteriores teologicamente aos Amesh Spentas, dos que parecem uma derivação no mundo Geti (mundo das transformações) do que são estes Sete Rios no Menok (mundo das causas). De ambos os sexos, se apresentam em pares, sob o mando de Sraosha, a obediência, a disciplina, reflexo no mundo Geti da Vontade e da Lei no Menok.

“Desenha uma caixa que não tenha, para cada um seus quatro lados, senão o comprimento da corrida de um cavalo, leva até ele os germes de gado, dos animais, dos homens, dos cães, dos pássaros e o fogo vermelho e ardente”.

Trata-se da Vara ou Recinto Sagrado, idêntico no simbolismo religioso da Arca de Noé ou da Argha (veículo) babilónico. É a Arca de Manú Vaivasvata, com os seus sete Rishis, cada um dos quais se apresenta como pai de uma Humanidade.

Em todos os casos é símbolo da matriz da Natureza, da Lua crescente, e do barco que perpetua a vida, do portador dos germes da ressurreição. Este é o significado que tem no mito de Yima. A Vara é o seio puro da Natureza onde os germes são guardados de todas as coisas num estado de congelamento, puros e a salvo de toda a dissolução. É o Homem como matriz da Mónada. “Vara ou Arca, ou seja, o Veículo, significa simplesmente o Homem… Aqueles homens guardados na Vara são os Progenitores, os Homens Celestes ou Dhyanis, os Egos futuros encarregados de animar a Humanidade”. (HPB Doutrina Secreta III)

“A Vara é o veículo dos nossos Egos animadores, isto é, o corpo humano, cuja alma está representada pela expressão: janela resplandecente por si mesma no interior”.

Glossário Teosófico, HPB

“A Vara significava o HOMEM da Quarta Ronda assim como a Terra daquele tempo, a Lua, e até a Arca Noé se assim o desejar”.

HPB Doutrina Secreta III

A forma quadrada do recinto acentua o simbolismo do veículo, de suporte. É a Personalidade humana, onde “tudo decorre mais lentamente”. É o recinto, a caixa, mas também a prisão. Porém é em seu significado mais sublime de “portador das sementes sagradas” como o encontramos nos versos do Avesta:

 “Entre os homens que estavam naquela cerca, não havia querelas nem desentendimentos, nem antipatia, nem inimizade, nem pobreza, nem enfermidade, nem dentes que estavam além da medida, nem deformidade corporal, nem nenhum dos sinais que constituem os sinais de Angra Mainyu, e que ele fez cair sobre os homens”.

Refere-se ao núcleo da fraternidade que exige a criação de uma nova Humanidade. Um núcleo sem fissuras que pode resistir ao difícil processo de transmutação interna que o torna uma sementeira de homens do futuro. Este processo no final do ciclo está muito bem descrito na famosa profecia do Vishnu Purana onde os homens purificados tornam as suas mentes puras como um cristal. Como na tradição hindu, também se compara o Homem como “A Cidade das Nove Portas”. Isto faz fisiologicamente referência às nove aberturas do corpo humano, e esotericamente à misteriosa relação do Homem com os Kumaras.

A VARA é um recinto e é um bastião, cercado por altos muros. Yima constrói no centro do mesmo uma torre elevada, com porta de acesso e uma janela “que procurava a luz na parte interior”. H.P.B. disse que esta janela é a alma, “uma janela resplandecente por si mesma no interior”. As “luzes incriadas” do mito são as que iluminam o Homem Interior, os seus “princípios”, as “luzes criadas” devem representar os astros e as irradiações psíquicas e kármicas que deles emanam.

“Lá, no Aryana Vaejo, onde a Vara é construída, as estrelas, a Lua e o Sol só se veem uma vez por ano sair e pôr-se, e um ano parece somente um dia [e uma noite]”.

H.P.B. explica este fragmento na Doutrina Secreta III

Primeira edição da Doutrina Secreta. Wikipedia

Isto é uma clara referência à “Terra dos Deuses” ou às (agora) regiões polares. Cada “Sol”  significava todo um ano, o qual se compunha então de um dia, assim como no Círculo Ártico se compõe agora de seis meses. Segundo os ensinamentos antigos, o eixo da Terra muda gradualmente a sua inclinação com a eclíptica, e no período a que isto se refere, era tal a inclinação, que um dia durava todo o período de revolução da Terra em volta do Sol, mediando uma espécie de crepúsculo de muito pouca duração, depois do qual a terra polar voltava a tomar a sua posição diretamente abaixo dos raios do Sol. Isto pode ser contrário à Astronomia segundo se ensina e se compreende agora, porém, quem pode dizer que não ocorressem, há milhões de anos as mudanças no movimento da Terra que não ocorrem atualmente?”

“Cada catorze anos, dois nascem de cada casal [hermafrodita] um macho e uma fêmea”.

H.P.B. relaciona isto com uma estância do Dzyan que diz:

“Na conclusão de cada quarenta sóis [anuais] no fim de cada catorze Dias, o dobro se converte em quatro; macho e fêmea em um, no primeiro, segundo e terceiro…”

Qual é o significado psicológico de que tudo na Vara se torna mais lento. Poderíamos referir-nos à Teoria da Relatividade de Einstein segundo a qual quanto mais perto da velocidade de um móbil à da luz, mais lento percorre tudo no interior do dito móbil (para um observador situado no interior dele mesmo). É, curioso, por um lado, está aumentando a velocidade consciente dos que se encontram no Recinto Sagrado, e assim se está mudando e melhorando a sua natureza interna, por outro, visto de fora é como se estivessem no casulo da imobilidade e assim evitam a destruição das formas, a dissolução de tudo aquilo “que estava indo rápido de mais” e, que nas curvas do tempo é jogado e feito em pedaços. O que aparentemente está imóbil parece que vai a uma grande velocidade, velocidade que o afasta do que aparentemente se move mais rápido. Todo um mundo de significados está nesta imagem do mito de Yima!

“Criador dos seres dotados de corpo, purificador, quem terá desenvolvido a Lei mazdayánica neste recinto que Yima construiu? Ahura Mazda respondeu: Oh Santo Zaratustra!, foi o pássaro KARSHIPTA”.

Dele se diz que “recita o Avesta na linguagem das aves” (Bundah IX y ss). A ave é o símbolo da Alma e do Anjo em todas as religiões. Disse H.P.B. que representa o Divino no Homem, a Alma Superior.

“Karschipta é a Alma-Mente humana e a divindade da mesma, simbolizada na antiga religião dos Mags por uma ave, assim como gregos a representavam por uma borboleta, tão logo como Karschipta penetrou em Vara, o homem compreendeu a Lei de Mazda ou a sabedoria divina” e acrescenta H.P.B. um dos comentários das estâncias do Dzyan que esclarece ainda mais a relação com a Alma Divina.

[É O] PÁSSARO ETERNO, CUJO BATER DAS ASAS PRODUZ A VIDA E CUJO NINHO É O ESPAÇO SEM LIMITES”.

Este é um dos mitos fundamentais de uma religião que prestou culto ao Fogo. De uma cultura que põe acento na pureza e na moral impecável em todos os atos. De um texto sagrado, o Avesta, que considera o mais agradável sobre a terra “que um homem santo caminhe sobre ela”, e em segundo lugar, a presença de “um homem que sabe construir a sua casa”.

É evidente que esta casa representa o “Castelo Interior” onde resplandece o Fogo puro do seu Ideal. Perante Ele vibrante, perante Ele forte, perante Ele responsável. Bela a Sabedoria que ensinou que àqueles que prestam juramento – no sentido clássico do termo, e não no atual – lhes serão revelados os segredos de Deus. Porque o Zoroastrismo foi uma religião que ensinou o poder regenerador da militância por uma causa justa, a importância da guerra divina, ou seja, a guerra interior contra as próprias sombras e limitações. Ensinou o poder dos que restabelecem a beleza da luz de Ormuz combatendo as inércias de Ahrimán. E, nesta mística persa, o fogo é a garantia e símbolo do esforço e da continuidade nas boas obras, o Fogo, dizem, é a veste da Justiça.

José Carlos Fernández
Escritor e Diretor da Noca Acrópole Portugal
Artigo escrito por volta de 1998

Imagem de destaque: Ahura Mazda, Derfash Kaviani. Creative Commons