“Roma, mãe das armas e das leis, que estendeu o seu Império sobre o mundo e deu o seu primeiro berço ao direito; que confortou o género humano, dando-lhe o seu próprio nome, e o tratou, não como rainha, mas como mãe; que chamou cidadãos aqueles que havia vencido, e atou com corrente de amor os extremos opostos da terra; a cujo pacífico génio todos devemos ter encontrado pátria sob estrangeiros céus e poder mudar impunemente de morada…”
Há um ditado tristemente correto que diz que “a História é escrita pelos vencedores”. O revisionismo histórico de hoje invalida em parte esta sentença, mas a sua execução é muito difícil porque as próprias fontes dos feitos passados aparecem viciadas e defeituosas.
Quando as pessoas hoje se referem a Roma de um ponto de vista político, geralmente a imaginam como uma nação conquistadora que escravizou centenas de povos, levando a imoralidade e a violência para onde ia. Mas será que isto é exato? Ao julgar Roma, geralmente tomamos em conta os seus aspetos negativos, que ela tinha, como todas as formas de civilização. Mas, seria justo e exato julgar o cristianismo apenas pelas fogueiras inquisitoriais ou, o atual século, pelos campos de concentração e câmaras de gás? É evidente que uma análise construtiva nos deve levar à consideração dos valores morais e materiais positivos que tendem a contrabalançar e até mesmo esfumar as imperfeições lógicas da existência humana.
Se, para além das máscaras e biombos que nos mostram ante a verdade investigadores interessados em defender dogmas à priori aceites por eles mesmos, reconhecermos o impulso unificador e ecuménico que animou Roma, desde as suas obscuras origens Etruscas até ao Império, veremos um ensaio de sincronização mundial não igualado desde então.
Nos nossos dias, a humanidade orgulha-se de ter uma União de Nações e na verdade é muito venturosa a sua existência, mas esta Organização, para os problemas básicos, não passa de ser um elemento simbólico, carente de profundidade, mas de considerável extensão. Essa superficialidade só é efetiva em pequenos países, novos e sem potencial próprio. As grandes nações não concordam com a arbitragem coletiva. A ONU cumpre o seu propósito em termos de saúde, assistência, etc., mas não ultrapassa nem ultrapassará além disso, a menos que mude radicalmente as suas estruturas.
Roma, pelo contrário, unificou numerosos povos em idioma, arte, vestuário, alimentação, ciências, direito, indústrias, filosofia e conceito religioso.
A nossa chamada “Civilização Ocidental” não é outra coisa que o resultado de várias combinações sobre os restos do Império Romano. As nossas línguas são degradações do Latim e o verbo de Cícero jaz escondido por trás da mais moderna construção gramatical. O mesmo poderíamos dizer de todos os outros temas, na medida em que, no Direito, na Arquitetura e na Filosofia, quais são os ramos do conhecimento tradicional em que a civilização atual tem procurado inovar nos últimos anos, é justamente onde o caos e a ineficácia se tornam mais notórias; as atuais leis de justiça social conduzem as esquerdas e as direitas a sistemas que cada vez mais se assemelham a um vício da decadência de Roma, a escravatura, por ter esquecido, precisamente, as romanas virtudes de uma ordem hierárquica estrita em que os cargos são “cargos” e não pensões honoríficas. Na Arquitetura e Filosofia, o Génio Grego que canalizaram para o futuro os pensadores do Império ainda é a fonte comum onde temos que beber se quisermos ter uma relação com o Belo e a Verdade; essas águas, ao contrário das do Letes, despertam as adormecidas consciências interiores e dão um hálito de eternidade às terrosas figuras que plasmam os humanos. Todo o resto, é filho do século em que o viu nascer e dura e é transmitido na medida em que tem uma relação com O Real, origem dos chamados “Classicismos”.
No que toca à religião é que a perplexidade atual é maior. Roma havia unificado todos os credos num Panteão e cada Povo que estava associado ao Império, contribuiu com os seus conceitos sobre as origens das coisas, o progresso moral do homem e a sua relação com a Divindade, para o fundo comum. Para um romano culto, e eram os cultos que faziam as leis estritas e potentes, todos os Deuses e Religiões eram diferentes formas de uma intuição comum e portanto era inconcebível discutir, muito menos lutar, pelas formas religiosas. Nas cidades romanas foi construído, um templo egípcio a Ísis em frente de outro Fenício a Astarte, enquanto na outra rua vizinha uma escola de filosofia empirista negava a existência dos deuses e pouco mais além, os jovens dançavam com as invisíveis Filhas de Dafne, num jardim sagrado, dirigido por sacerdotes da Tessália. Mesmo aos credos contrários à fraternização, como o Judeu e o Cristão, foram trazidos à civilização, construindo para eles os seus próprios templos em Roma, como as descobertas arqueológicas confirmam desde há 50 anos.
O conceito político de Roma baseava-se na reunião de todos os homens, para além das suas crenças ou hábitos, unindo-os fortemente a um eixo comum, com uma Capital Mundial e um Estado-polícia que reprimia as desordens dos ainda não endoculturados. Essa união não era mera afirmação verbal em frases lacrimosas nem implorantes, mas a confirmação em atos e repressão legal de qualquer tentativa de retrogradação dos povos à barbárie do separatismo.
Precisamente, a esse Conceito Político se dirigirá inexoravelmente a atual humanidade, para desgosto de extremistas de todas as cores. Uma União das Nações, firme, sobre bases sólidas, onde nenhuma potência isolada possa colocar em perigo a integridade do Sistema; onde os recursos sejam distribuídos de acordo com o mérito de cada um; com uma língua comum; uma cultura comum; uma paz comum perante a qual se inclinem todos os homens honestos, intérpretes das leis da natureza, encarnadas no Estado. Uma infinidade de formas religiosas, artísticas, filosóficas, mas todas elas na convivência que leva o conhecimento de que são meros recipientes, reflexos efémeros do Desconhecido Impulso que justifica o ser e não ser de todas as coisas em todos os mundos, lugares e dimensões conhecidas ou por conhecer.
O Império Romano foi um ensaio político que não conseguiu sobreviver nem durar, fragmentado pelos problemas daquela época; mas, com um sentido mundial afirmado em melhores meios de transporte e difusão e meios técnicos infinitamente superiores, as novas gerações construirão, em maior ou menor tempo, uma Roma Ideal que cobrirá o planeta e a humanidade será como uma imensa colmeia, ordenada e harmoniosa. Ali virão os Deuses para beber o mel da realização integral emoldurada pela Lei, o Amor e a Inteligência.
O nome do autor não aparece
Publicado no N.º 22 da Revista Estudios Teosóficos, Diretor Jorge Ángel Livraga Rizzi, Argentina, 1963
Imagem de destaque: Maqueta de Roma no tempo de Constantino, Jean-Pierre Dalbéra. Creative Commons