Agora que se iniciou o ano de 2021, é impossível fugir ao facto que 2020 foi um dos anos mais difíceis de que há memória. Não só em Portugal, mas no mundo inteiro, a pandemia da COVID-19 provocou inúmeras perdas humanas e materiais, e apesar do futuro próximo ser um pouco mais animador, ainda não vencemos esta batalha.
Ao longo da História, várias pandemias e epidemias ocorreram, sendo a Gripe Espanhola, a Varíola, a Tuberculose, a Cólera ou a Peste Negra algumas das mais notórias. No entanto, outras epidemias, quer pelas suas consequências não terem sido tão devastadoras como também por terem tido um período de ação mais curto, foram quase esquecidas com o decorrer das séculos.
Tendo isto em conta, hoje venho falar da epidemia da dança que surgiu, esporadicamente na Europa, no decorrer da época medieval. Os dois eventos mais notáveis deste fenómeno ocorreram em Aachen (Alemanha) em 1374 e em Estrasburgo (França) em 1518.
Estes eventos tinham um início quase sempre muito semelhante, que consistia numa única pessoa ou num grupo reduzido começar a dançar freneticamente, no meio das ruas, sem nenhum motivo aparente. Com o passar dos dias cada vez mais pessoas eram “contagiadas” e estas dançavam interruptamente durante horas e horas, sem pararem para descansar, comer ou até mesmo hidratarem-se. Algumas destas ocorrências chegaram a durar algumas semanas, o que levou à morte de várias pessoas por fraturas múltiplas, desidratação ou ataques cardíacos provocados principalmente devido à exaustão.
Até hoje ainda não há uma explicação científica concreta para este fenómeno. Ainda assim a teoria mais aceite atualmente diz-nos que estas manifestações poderiam ter-se originado como uma resposta mecânica ao intenso stress e sofrimento coletivo que as populações passaram durante estes séculos, tanto com a horrível mortalidade causada pela Peste Negra como pela destruição provocada pelas inúmeras guerras que se sucediam. Cenários macabros de morte e ruína tornaram-se recorrentes e “normais” o que levaria muitas pessoas a um exagero de celebração do dia a dia, “pois nunca se sabe se amanhã estaremos cá para viver o resto”, desencadeando assim respostas psicológicas extremas que deram origem a estas danças frenéticas e sem paragem. O desejo de querer esquecer o passado e presente extremamente duro poderá então ter levado a este transe coletivo.
Esta é, assim, uma das mais enigmáticas epidemias alguma vez vivenciadas e documentadas pelo ser humano. E quem sabe se depois de ultrapassarmos o COVID-19 não surjam novas pistas para se desvendar/descobrir a origem das epidemias de dança que atingiram o seu pico entre os séculos XIV e XVI.
Até lá, votos de um Feliz Ano com muita paz e sobretudo muita saúde. Que 2021 nos traga mais cultura e também um bocado mais de “normalidade”! Força!
João Sousa
Mestre em Ecologia