“Os deuses criaram as Amazonas para influenciar o coração dos Homens com Amor e restaurar a paz na terra.”

As palavras saíam serenas e calmamente dos lábios de Hipólita, rainha das Amazonas, à medida que contava a história destas guerreiras à sua pequena filha, a princesa Diana. A menina absorvia com entusiasmo as palavras da sua mãe e ficou a saber que há muito tempo, quando os deuses governavam a terra, o seu líder, Zeus, criou a humanidade à sua semelhança, para que esta pudesse adorá-los. A sua criação não poderia ser melhor já que os seres humanos eram justos e bons, fortes e impetuosos. Havia um clima de paz e harmonia proporcionando um verdadeiro Paraíso.

Porém, na manifestação existe a dualidade e onde existe luz também existem sombras. Estas viviam no coração de Ares, o deus da guerra e um dos filhos de Zeus. Invejando secretamente a criação do seu pai, decidiu corromper o coração dos homens com suspeita e ciúmes. Estes, fracos de espírito, não conseguiram resistir e a discórdia e a guerra açoitaram duramente a terra.
Perante este cenário de devastação os deuses criaram as Amazonas com o objetivo destas cultivarem o Amor e restaurarem a paz entre a humanidade.

A influência destas guerreiras foi imediata e, durante um tempo, a divisão e o conflito foram afastados do seio dos seres humanos. Coisa de pouca duração, pois as trevas não são afastadas com tanta facilidade e uma parte dos homens tentou escravizar as Amazonas, que tiveram que lutar arduamente para não se deixarem aprisionar. Os deuses não ficaram indiferentes à situação e alinharam ao lado das guerreiras. Quando tudo parecia pender para o lado do Bem, Ares, furioso, interveio e não poupou os seus recursos, matando cada um dos seus congéneres, exceto Zeus, seu pai. Este último, utilizando todo o seu poder conseguiu colocar um fim aos intentos do seu nefasto filho. Exaurido, no limite das suas forças, o sábio governante, com o pouco que lhe restava, criou a paradisíaca ilha de Temiscira, situada em parte incerta e dissimulada dos olhares humanos, para que fosse o lar das valorosas guerreiras que tanto empenho tinham tido na sua missão. Temendo que Ares algum dia pudesse voltar, deixou como legado uma arma, a Godkiller, com poder suficiente para impedir o avanço do obscuro deus.

A menina, atenta, sorveu todas as palavras antes de, tranquilamente, adormecer.

Desde essa época longínqua e sob a sábia liderança de Hipólita, as Amazonas tinham fomentado uma comunidade onde a fraternidade, a concórdia, a disciplina, o sacrifício, a entrega ao bem comum, a beleza e a harmonia estavam presentes em cada recanto da ilha, originando um cenário paradisíaco. Mesmo não tendo notícias de Ares, não deixavam de se manter preparadas, treinando arduamente nas artes da guerra, superiormente supervisionadas pela maior guerreira da sua história, a general Antíope, irmã da rainha.

Em primeiro plano, a Rainha Hipólita tendo logo atrás a sua irmã Antíope.

A palavra “amazona”, segundo a etimologia popular grega, provém de a (não) e madzós (seio), ou seja, sem-seios. Segundo esta tradição, estas guerreiras, que eram situadas no Ponto Euxino, na Cítia ou na Lídia, mutilavam o seio direito para poderem manejar com maior destreza o arco. Toda a mitologia tem um aspeto simbólico e neste caso as amazonas representam a mulher que foge da sua natureza feminina para se masculinizar, ou seja, procura ocupar o papel do homem e não completá-lo.

No filme, porém, as Amazonas mantêm a sua feminilidade mas sem descurar a condição guerreira. O facto de se cultivar a arte militar não quer dizer que se tenha de anular o aspeto feminino. Um exemplo histórico claro foi dado em Esparta. As mulheres, apesar de terem uma educação ligeiramente diferente da dos homens, eram treinadas para lutar e em caso de emergência contava-se com elas para a defesa da cidade. No entanto, era referido pela Grécia toda que eram das mulheres mais formosas e belas do território.

O ambiente de disciplina e rigor em que viviam as Amazonas encantava a pequena princesa. Ela vivia fascinada ao ver as suas irmãs treinarem de forma árdua e intensa, e frequentemente furtava-se à vigilância das suas amas para ir observar as guerreiras nas suas manobras e imitar os seus movimentos precisos.

Antíope, com olhar observador, já tinha notado o entusiasmo da sua sobrinha, mas o seu desejo de iniciar Diana no sistema de treino das Amazonas era contrariado pelo da sua irmã, a Rainha Hipólita. Este temia que a sua filha pudesse ser localizada por Ares e, devido a esse temor, não permitia que Diana iniciasse a educação militar.

Sentindo que esse não era o caminho e não querendo contrariar o entusiasmo da princesa, Antíope furtou-se às ordens da irmã, começando a instruir em segredo a pequena Diana.

“Continuas a duvidar de ti, Diana”, afirmava Antíope, “tu tens mais força do que pensas. Tens mais poder do que pensas.” Com estas palavras procurava fazer com que a sua pupila fosse mais concentrada e mais precisa na forma de lutar.

Robin Wright como Antíope em Wonder Woman (2017). Wikiwand

A sábia guerreira procurava extrair o melhor da pequena princesa, fazer com que ela superasse as suas limitações e entraves psicológicos. Procurava incutir nela um espírito de superação. Entre as duas foi-se estabelecendo, ao longo dos anos, uma forte ligação. Apesar de ser submetida a muita pressão, a princesa respeitava a sua mentora; e esta demonstrava todo o seu amor na exigência que colocava nos treinos.

Antíope era o Mestre que procurava guiar o seu discípulo na via das guerreiras amazonas. O Mestre é aquele que tem um conhecimento derivado da sua própria experiência no caminho que está a transmitir. Ele percebe a importância desse caminho e quais os elementos que podem fazer com que o discípulo possa fracassar e quais as virtudes que devem ser desenvolvidas para que este triunfe. A sua entrega e dedicação são incondicionais, livres dos entraves do egoísmo que procura somente transmitir o suficiente para que as capacidades do discípulo não ultrapassem as do Mestre. Antíope não retinha nada, exigia que Diana se desenvolvesse, se tornasse cada vez melhor e que até a pudesse ultrapassar, tal era o Amor que lhe dedicava.

Durante anos, a vida prosseguiu tranquilamente o seu curso normal em Temiscira, até que um dia, enquanto Diana se encontrava a observar o céu, divisa um estranho objeto que sulca os céus. Era um avião, pilotado pelo capitão Steve Trevor, piloto das Forças Expedicionárias Americanas, e que vinha desgovernado, terminando por cair perto da orla costeira da ilha. Rápida na reação, a amazona lança-se à água para resgatar o estranho. Mal os dois colocam os seus corpos em terra, logo se apercebem da chegada de um cruzador alemão que vinha no encalço do avião. Após séculos se isolamento, a ilha tinha sido descoberta e estava prestes a ser invadida.

Rapidamente as Amazonas colocam-se em ação e um confronto intenso ocorre na praia. Dois mundos diferentes colidem, separados por séculos: o das intrépidas guerreiras munidas com espadas, lanças, arcos e flechas e o dos homens armados com pistolas e espingardas. O confronto é intenso, mas valendo-se da sua grande destreza física, da sua enorme perícia com as armas e, acima de tudo, da sua união que se refletia no espírito de entreajuda, as Amazonas tomam vantagem. Os seus movimentos eram rápidos, graciosos, elásticos, precisos e coordenados. Pareciam um só corpo a movimentar-se por entre os adversários, que iam sendo derrubados de forma inequívoca.

A invasão é travada, mas o preço pago é muito alto: no meio da batalha, vendo a possibilidade da sua amada discípula levar com um tiro mortal, Antíope reage rapidamente colocando-se entre Diana e a bala sendo, assim, mortalmente atingida. Um angustiante grito de dor corta o ar quando a princesa vê a sua mentora tombar atrás de si. Rapidamente se dirige na sua direção, amparando-a com os seus braços.

Um profundo sofrimento espalha-se pelo coração de todas as Amazonas, pois a grande guerreira, sábia instrutora e maior general da sua história, respeitada e admirada por todas, venerada e amada pela princesa, encontra o seu fim. Era o supremo sacrifício para que a sua discípula pudesse viver e prosseguir o seu percurso. É nos braços de Diana que Antíope solta o seu último suspiro.

Apesar da enorme dor, as Amazonas não tinham muito tempo para o luto, o seu isolamento tinha sido quebrado, diversos homens tinham chegado às costas da ilha, seres com roupas estranhas e armas desconhecidas. O que tinha acontecido ao mundo? Que caminhos percorria agora?

Utilizando o Laço da Verdade, que faz com que quem estiver sob a sua influência não consiga mentir, interrogam Steve Trevor que confessa ser um espião. Também descobrem que o mundo está mergulhado num imenso conflito, a I Grande Guerra Mundial, e que Steve estava a ser perseguido porque tinha furtado o caderno pertencente à pérfida cientista espanhola, Isabel Maru, mais conhecida como Dra. Veneno, onde estava descrito todo o processo de desenvolvimento de um poderoso gás mostarda que ela se encontrava a desenvolver, seguindo as ordens do maquiavélico general alemão Erich Ludendorff. Os alemães pretendiam utilizar este gás na Guerra e, por isso, Steve refere que é importante que esta informação chegue aos seus superiores em Londres.

Acreditando convictamente que o conflito entre os homens se devia à presença de Ares, Diana propõe-se a sair da ilha para ir ao encontro do deus e derrotá-lo. A sua mãe, no entanto, opõe-se firmemente a isso. Desta vez Diana terá que ultrapassar a situação sozinha, pois já não conta com o apoio de Antíope.

“Os deuses criaram as Amazonas para influenciar o coração dos Homens com Amor e restaurar a paz na terra”.

Estas palavras ressoavam no interior da princesa, que acreditava firmemente naquilo que elas expressavam. Assim, contrariando as indicações da mãe, Diana apossa-se da espada cerimonial, que acredita ser a temível Godkiller, e juntamente com o Laço da Verdade e o Escudo, parte com Steve Trevor para Londres.

Os três objetos que Diana leva consigo estão associados com as Armas Mágicas que todos os Heróis, de diversas mitologias e tradições, transportam quando iniciam a sua aventura: Thor e o seu martelo Mjolnir, na mitologia nórdica; Artur e a sua espada Excalibur, na tradição cavaleiresca; Hércules e a sua Maça, na mitologia grega, etc. Todos estes Heróis são símbolo da luta que o ser humano tem que realizar para superar as adversidades da vida e chegar à conquista de si mesmo. As armas não servem somente para serem utilizadas na guerra exterior, são também o símbolo da guerra interior que todo o Herói tem que travar para poder atingir a sua missão de vida estando, deste modo, associadas a um conjunto de virtudes e valores.

Comecemos pelo simbolismo da espada. Nas tradições guerreiras ela é o símbolo da valentia na luta por uma causa justa. Na tradição da Cavalaria é o símbolo da Vontade do cavaleiro e, nesse sentido, representa a força espiritual do seu portador na busca de encarnar os Ideais que defende. Por exemplo, no Japão, os samurai tinham uma ligação muito forte com o seu sabre, ele era o símbolo do estado do guerreiro e da sua virtude, mas também significava força e honra. A espada representa a separação do bem e do mal e daí a sua vinculação à justiça.

Mais esotericamente, está associada ao poder que o Espírito tem para controlar a matéria.

Quanto ao escudo, o filósofo maiorquino Ramon Llull, no seu Livro da Ordem de Cavalaria, refere que significa ofício de cavaleiro, pois este último deve colocar o seu corpo como um escudo para proteger o seu senhor. Como arma defensiva e protetora, tem uma função similar ao da armadura: isolar e defender o seu portador. Sendo uma arma que somente tem razão de utilização em combate, também se constitui na fronteira entre o portador e o seu adversário, embora também possa ser encarado como símbolo da fronteira entre a pessoa que o utiliza e o mundo circundante.

O Laço da Verdade apresenta uma curiosidade relacionada com o criador da Mulher-Maravilha, o psicólogo e escritor americano William Moulton Marston, de quem se diz que desenvolveu instrumentos que mediam a pressão sanguínea, o que levou ao advento do polígrafo detetor de mentiras. Quem sabe se o autor não quis transpor isso para o Laço.

Abandonando o conforto da sua ilha, e após vários dias no mar, Diana e Steve Trevor chegam a um cenário totalmente diferente da luminosa, ordeira e harmoniosa Temiscira: a cinzenta, nublada e caótica cidade de Londres. Que diferença abismal! O primeiro era um mundo criado pelos deuses, o segundo era um cenário montado pelo Homem. A heroína ia entrar num mundo totalmente diferente e oposto ao seu. É a entrada num local desconhecido, onde deverá aprender a manter a sua integridade e superar as barreiras impostas.

Com o seu porte altivo, ar desenvolto e muito à vontade para expressar a sua opinião, Diana contrastava com o papel da mulher na época. Estas tinham que se vestir forma discreta e sóbria; a sua opinião em assuntos da sociedade não era quase tida em conta; não tinham cargos no Governo, enfim, limitavam-se a ser mães, enfermeiras, secretárias, submissas e pouco mais.

A amazona toma consciência desta condição quando se desloca ao Supremo Concelho de Guerra com Steve Trevor, para que este entregue o caderno roubado à Dra. Maru aos seus superiores. Ambos entram numa sala onde estava a decorrer um plenário com a participação de Sir Patrick Morgan, que defendia a ideia de um armistício com a Alemanha. Ao procurar opinar sobre algo logo após o final da sessão, Diana depara-se com o espanto dos participantes ao constatarem que uma mulher se encontrava na sala e ainda por cima emitindo um juízo seu. Apesar dos esforços empreendidos para a retirar da sala, a princesa aguenta-se firmemente e impõe a sua presença, acabando por ajudar a traduzir o caderno da Dra. Maru, espantando a todos.

A pérfida cientista Isabel Maru

Mais espantados ainda ficaram quando Diana, constatando que os ingleses não iriam procurar anular a ameaça do gás para não colocar em perigo a negociação do armistício, se revolta e afirma que na sua terra os comandantes não ficam atrás de secretárias a tomar decisões sobre a vida dos soldados mas combatem no campo de batalha ao lado dos mesmos, colocando também as suas vidas em risco.

Os valores de Temiscira não valiam no mundo dos homens, aqui a vida parecia não importar, as pessoas eram números. Havia como que um distanciamento de quem comanda em relação ao sofrimento dos que passavam pelo impacto da guerra e ao esforço dos soldados que combatiam o inimigo em condições desumanas: colocados em valas, durante meses, ao frio e à chuva, passando fome e ganhando doenças. Os comandantes deviam ser responsáveis por aqueles que comandam, eles deviam guiar da melhor maneira, educar no sentido da responsabilidade e do dever, e tomar decisões que tivessem em conta o justo. Quem comanda deveria estar ao serviço do conjunto, devia ser escolhido devido ao seu mérito, às capacidades demonstradas para poder exercer esse cargo.

Mesmo sendo proibido de empreender alguma ação contra a Dra. Veneno, o Capitão Trevor, convencido por Diana, recruta alguns conhecidos seus, o espião Sameer, o atirador Charlie e o contrabandista índio Chief, para o ajudarem numa missão secreta de modo a impedirem a libertação do gás mostarda na Frente Oeste. O fator inesperado surge com o apoio financeiro do próprio Sir Patrick Morgan, principal defensor do armistício.

O heterogéneo grupo parte para a Bélgica. O cenário que os rodeia no percurso que vão efetuando rumo ao seu objetivo é duro: um rio imenso de pessoas feridas e famintas; pais a transportarem crianças quase inanimadas, idosos a puxarem carroças com os poucos pertences que conseguiram salvar.

Diana não consegue ficar indiferente ao que está a assistir. Enquanto o grupo avança parecendo quase nem reparar no sofrimento em redor, a princesa procura assistir as pessoas, ampará-las. Steve chama-lhe a atenção e procura que dissuadi-la, pois não havia tempo para isso, a missão estava em primeiro lugar. O coração da amazona, porém, dizia o contrário, tinha que haver tempo para ajudar os necessitados, não se podia virar costas a toda a dor que estavam a presenciar. E quando uma mulher, aflita e chorosa lhe diz que a sua aldeia, chamada Veld, está a ser acossada pelos alemães há vários dias e que muitas vidas estão em perigo, Diana não suporta a situação e decide atuar.

O grande problema era que a aldeia se encontrava por trás de uma bateria de armas de fogo alemãs, colocadas a mais de 100 metros de distância da trincheira onde os heróis se encontravam. Atravessar o terreno até chegar às armas era praticamente impossível. Tanto era assim, que durante semanas ninguém tinha avançado um centímetro sequer no terreno, deixando a aldeia à abandonada à sua sorte.

Mas todos os factos apresentados não foram suficientes para demover a corajosa amazona de procurar cumprir com a sua missão: proteger os desprotegidos. Deixando o manto escuro que tinha por cima da sua colorida armadura, Diana sai determinada da trincheira, perante o ar de espanto de toda a gente. O que é que aquela mulher iria fazer perante as metralhadoras que se encontravam metros à sua frente? Não tinha sequer uma arma de fogo, somente um escudo e uma espada. O tempo parecia ter parado, todos pareciam ter suspendido a respiração, à espera do que iria acontecer.

Gal Gadot como Diana Prince / Mulher Maravilha

Os tiros começam a soar. Uma bala voa, a guerreira bloqueia com um dos seus braceletes. Outra bala, outro movimento para desviá-la com a ajuda de outro bracelete. O tempo começa a acelerar, os tiros vão sendo mais rápidos, a princesa vai acelerando a sua corrida e os seus movimentos, a respiração dos seus companheiros torna-se mais intensa. Diana corre, desviando-se das centenas de balas disparadas ou bloqueando-as com o seu escudo e braceletes. A meio do caminho, com o escudo colocado à sua frente, a corajosa e intrépida guerreira é travada pela barragem de tiro que é totalmente concentrada na sua aparentemente frágil figura. A sua determinação, porém, era feroz, os tiros continuavam a impactar no seu escudo, mas ela aguentava firmemente, sem recuar um milímetro.

Tal determinação acaba por inspirar os seus companheiros que rapidamente abandonam a proteção da trincheira e ajudam-na a conseguir atingir o objetivo: salvar a vida das pessoas que se encontravam na aldeia.

Diana não contrariou uma característica associada à energia feminina, a de proteção da Vida. É a mulher que dá a Vida, pois é no seu seio que ela é gerada. Desde tempos pré-históricos que esta faceta era alvo de uma atenção especial, nomeadamente no culto da Deusa-Mãe, associada à Mãe Terra e personificada como uma deusa geradora de vida. A famosa Vénus de Willendorf é um exemplo desse culto. Esta pequena estatueta é uma idealização da figura feminina sendo os seios e a barriga extremamente volumosos o que demonstra uma forte ligação com o conceito de fertilidade.

Para além disso, a mulher é a grande cuidadora, que dedica as suas capacidades para preservar a vida, alimentando os famintos, cuidando dos feridos, protegendo as crianças. Diana foi fiel a essa energia, ela não poderia virar costas a todo o sofrimento e dor que estava em seu redor e seguir indiferente no cumprimento da missão que tinham em mãos. Fazer isso seria voltar as costas à sua natureza.

Um breve festejo é realizado na aldeia antes da partida do grupo para o Alto Comando Alemão situado ali perto onde iria decorrer uma gala com a presença do general Erich Ludendorff, que Diana acreditava ser Ares disfarçado. Era também nessas instalações que supostamente se encontrava o mortal gás.

A missão não corre bem. Steve impede Diana de matar o general Ludendorff para não colocar em risco a missão de localizar e destruir o gás, mas isso possibilitou a sua libertação na aldeia de Veld, causando a morte de todos os seus habitantes. Todo o esforço empreendido anteriormente parecia ter sido em vão. A alegria e o conforto de uma missão cumprida aquando do salvamento da aldeia, cedeu passagem à dor e à consequente ira pela perda da vida de pessoas inocentes.

Diana, culpando Steve pelo sucedido, parte enfurecida para uma base militar, onde um avião está a ser carregado com o gás para ser libertado em Londres. O seu objetivo era matar Ludendorff e colocar definitivamente um fim a esta loucura chamada guerra.

O confronto é intenso, mas a princesa não vacila e, no momento certo, consegue matar o seu inimigo. Paz, finalmente. Ela já poderia descansar.

Porém, os tiros não cessam, as bombas continuam a ser largadas e o avião continuava a ser carregado com o mortal gás. A princesa está atónita. O que estava a acontecer? Ares tinha sido morto, por que o conflito seguia? Ela não tinha resposta.

Esta surge quando aparece a figura de Sir Patrick Morgan, o negociador do tratado de paz e secreto financiador da aventura de Steve e Diana para neutralizar o general e a sua pérfida cientista. De forma surpreendente ele revela ser Ares, causando um tremendo impacto na princesa.

Mas a grande revelação para ela foi a de que Ares não era o causador da guerra e da violência. Embora ele, subtilmente, inspirasse ideias e emoções aos seres humanos, a última decisão era sempre deles. Apesar da sua condição de deus, Ares não tem o poder de determinar o curso dos acontecimentos.

É uma revelação importante, pois transmite a responsabilidade das decisões e consequentes ações, quer estas sejam boas ou más, para o ser humano. Frequentemente procura-se culpar os deuses, o destino e as circunstâncias pelos problemas que se tem. Porém, estes são fruto das ações de cada indivíduo e cada ser humano deve ser responsável por aquilo que faz devendo aceitar as consequências inerentes. Há que aprender com os erros e não voltar a repeti-los

Passado o momento de surpresa, e enquanto Steve tenta impedir a partida do avião com o gás rumo a Londres, Diana confronta-se com Ares. Este tenta persuadir a amazona a ajudá-lo a destruir a humanidade, pois acredita que os humanos são corruptos e a sua presença impede a possibilidade da existência do Paraíso tal como havia no início. Bastava olhar em volta e constatar o conflito que estava a decorrer.

A corajosa amazona declina e tenta matar o deus com a temível espada Godkiller somente para ficar espantada com o facto dela fica totalmente destruída após ter atingido Ares.

A esperança estava perdida? Se a temível arma tinha sido estilhaçada, que mais haveria a fazer para colocar um fim à pérfida presença de Ares?

Este alegrava-se com a situação e com os segredos que estavam na sua posse e que ia projetando contra Diana, como dardos, cuja intenção não senão a de a ir debilitando psicologicamente. O maior de todos talvez fosse o que Ares largou dos seus lábios a seguir, a verdade por trás do temor de Hipólita em educar a sua filha como amazona: Diana era a verdadeira Godkiller, a temível arma que poderia matar o deus da Guerra. Quase a dar o último suspiro, Zeus gerou Diana, deixando-a ao cuidado das Amazonas.

Enquanto isso, Steve travava os seus próprios combates. Após ter destruído o laboratório da Dra. Maru, vai atrás do avião que estava a descolar com a carga mortal. Após neutralizar os pilotos, Steve não vê mais alternativa para impedir a libertação do gás do que dirigir-se para uma altitude o mais superior possível e explodir o avião, permitindo, assim, que a carga se dissipasse sem consequências para os humanos.

Uma explosão ocorre, iluminando o céu. Diana apercebe-se da situação e uma dor tremenda inunda o seu ser, percorrendo cada músculo, cada tecido, cada célula. Vendo a princesa submergida em raiva, Ares vê a oportunidade de poder converter a princesa à sua causa. Tendo a Dra. Veneno por perto, sugere a Diana que a mate, pois ela é a grande culpada pela situação.

Nestes momentos de fragilidade, quando o sofrimento impera, é quando o ser humano comete atos que mais tarde vem a arrepender-se. Era a prova da intrépida guerreira: ceder à tentação de matar a pérfida Dra. Maru, demonstrando fraqueza de espírito ou mostrar uma grande força interior e manter o caminho das Amazonas: espalhar Amor e Paz. À sua mente vêm as recordações das experiências vividas com Steve Trevor e o seu grupo, a amizade forjada na adversidade e, acima de tudo, a crença que o capitão tinha, apesar de contrariada pela guerra existente, de que no fundo a humanidade era boa.

Do seu coração gotas de compaixão vão-se juntando até se tornarem num manancial capaz de apagar o fogo da raiva. A barreira do auto-controlo tinha sido implantada e a Ares já não restava mais opção do que enfrentar Diana e eliminá-la. Mas ocorre precisamente o contrário, com o pérfido deus a ser destruído pelo seu próprio raio.

Pouco tempo depois, a guerra termina e o grupo festeja esse acontecimento, apesar da tristeza pela morte do capitão Trevor.

Diana encerrava o seu ciclo. Tinha deixado a ilha de Temiscira, contra a vontade da sua Rainha e mãe, acreditando que a missão das Amazonas era estar presente onde os conflitos e guerras grassassem, de modo a promover a Harmonia e proteger os aflitos. Tinha perdido a sua ingenuidade ao constatar que por pior que Ares fosse, ele somente influenciava as pessoas e que elas é que determinavam o curso dos acontecimentos, pois por fraqueza de espírito ou por ingenuidade, sucumbiam à tentação do deus e promoviam as guerras. Aprendeu com Steve a confiar no Bem que existe no mais profundo do ser humano e aprendeu a lidar com a dor de perder alguém amado. Por último, demonstrou coragem em várias situações: ao abandonar o seu lar e entrar no desconhecido, ao enfrentar a sociedade humana sem deixar deturpar a sua escala de valores, ao colocar a sua vida em risco para salvar outras, ao assumir o papel que sentir ser o seu. Agora ela estava pronta para se tornar protetora da humanidade e promotora da Paz e do Amor.

O Capitão Steve Trevor com Diana

Realizado por Patty Jenkins, Mulher-Maravilha é um filme que prende pela história, pelos cenários bem construídos e pela incerteza do desenlace.

A ilha de Temiscira está construída superiormente, mostrando a harmonia, grandeza e origem divina das Amazonas.

Espetacular a coreografia de luta das guerreiras, um misto de rapidez, agilidade e potência, mas sem deturpar a feminilidade.

Há algum tempo afastada dos grandes filmes, Connie Nielsen reaparece de forma majestosa no papel de Rainha Hipólita.

A personagem de Antíope, tia e mentora da princesa Diana, é solidamente representado por Robin Wright.

Chris Pine aparece como o pragmático e rebelde, mas bondoso, Steve Trevor, de forma convicente.

Mas todos os focos vão para a surpresa que é Gal Gadot como Mulher-Maravilha. A ex-miss Israel parece ter nascido para o papel, excelente presença física, bela voz, grande expressividade, em suma, uma grande atuação como a sensacional heroína.

Como curiosidade, referir que este é o primeiro filme realizado por uma mulher e com uma heroína feminina no papel principal.

Em suma, um filme que pode ser visto e revisto sem que haja aborrecimento.

Bibliografia

Simbolismo del Sable Japones

Significado de Espada – Dicionário de Símbolos

Simbolismo de… el escudo

Wonder Woman: 15 Things You Didn’t Know About Her Sword And Shield

Brandão, Junito de Souza; Mitologia Grega, vol. 3, Editora Vozes, Petrópolis, 1987.