Eco é o nome de uma ninfa dos bosques e das fontes, personagem central que explica a origem do eco.
Eco era uma ninfa que amava Narciso.
Narciso era um deus que se amava a si mesmo olhando o seu reflexo nas águas do rio.
Um mito conta-nos muitas verdades sobre o ser humano, a vida, a Natureza.
Os mitos gregos são autênticas histórias de sabedoria.
Eram o evangelho daqueles tempos.
Eram as histórias bíblicas daqueles tempos remotos.
Os mitos podem ser interpretados segundo vários níveis de entendimento.
Podemos interpretar da seguinte maneira este mito de Eco e Narciso:
Pessoas fúteis são pessoas eco que seguem os outros.
Há sempre um Narciso que aparece e que emite um juízo.
As pessoas Eco vão atrás, enamoradas pelo Narciso.
Não pensam no que os Narcisos lhes dão e vão logo atrás.
Narciso, os grandes influenciadores do nosso tempo, fazem um juízo emitido para o seu próprio reflexo nas águas que diz: eu sou poderoso!
Eco, enamorada de Narciso, repete: poderoso, poderoso, poderoso!
Vejam-se alguns políticos, os que dizem argumentar verdades, vaidades e populismos, representam Narciso.
Vejam-se agora as audiências, o público passivo, a multidão faminta de pais, as pessoas que seguem os seus Narcisos nas redes sociais.
Podemos representar todas estas pessoas pela personagem Eco.

Estudo da posição de Eco. Domínio Público
Narciso é também o Ego: são, basicamente, os nossos interesses egoístas.
Narciso representa também o interesse de uma pessoa só.
Ser Narciso é ser vaidoso, é olhar só para si no espelho das águas do rio.
As pessoas Eco vão atrás de Narcisos.
Repetem e seguem inconscientemente as palavras de Narciso.
Podemos acrescentar, nesta interpretação livre também que…
Os subjugados repetem os comportamentos de quem as subjuga.
Os dominados repetem os comportamentos e as ideias daqueles que os dominam.
A massa que não critica repete somente as superstruturas, levianamente, as modas seguem-se inconscientemente sem sequer se pensar duas vezes nas intenções, nos interesses escondidos que têm os Narcisos deste mundo.
Eco é dominada por Narciso pois está presa por amor a este.
Do mesmo modo, as pessoas Eco, por semelhança, enamoram-se dos Narcisos por gostarem deles fazendo as suas vontades.
Narciso é também a nossa vontade de nos autoconhecermos, de olharmos para o escuro de nós mesmos.
Eco representa a resposta ao nosso anseio de autoconhecimento, é a voz que está em nós e que nos responde quando vislumbramos, nas águas paradas da mente, o que somos e dos ditames dos céus em nós mesmos.
Daí os ecos do pensamento emanados por Narciso, aquele que se contempla a si mesmo.
Eco representa uma ideia que não é nossa e que simplesmente seguimos.
Sem questionar ou ter vontade própria para emitir um pensamento seu, certas pessoas imitam e repetem os pensamentos e as vontades dos outros, seguem desmesuradamente os Narcisos que dominam os bosques.
Viemos ao mundo para espalhar uma mensagem única.
Cada pessoa emite uma mensagem para nós.
Podemos fazer como Eco e repetir essa mensagem sem a questionar vivendo a vida dos outros, sendo figurantes no filme dos outros.
Ou podemos ser um pouco como Narciso e perguntar ao espelho, a nós mesmos, se devemos seguir essa mensagem ou não, tendo a oportunidade libertadora de sermos realizadores do nosso próprio filme, da nossa própria vida.

Eco e Narciso, John William Waterhouse (Detalhe). Domínio Público
Ser livre dessa forma é poder usar o livre arbítrio, é poder exercer o livre exame e conceber um pensamento individual, isso é ser autónomo, independente, firme.
Conhecer a nós mesmos é pensar por nós mesmos.
É não sermos Ecos dos primeiros aparentes mestres que carregam os archotes de fogo desfilando e que vão fazendo sombras na caverna para os escravos amarrados a mitos entorpecentes decifrarem e acreditarem tudo aquilo como sendo as únicas verdades – como bem nos diz Platão na sua alegoria da caverna.
Cada pessoa é um livro para se poder ler.
Pode ser um livro escrito pelo próprio autor ou um passivo caderno em branco escrito somente pelos outros.
Eco é um caderno em branco onde outros escrevem.
Só ecoa as ideias dos outros, a vontade dos outros, serve apenas para os outros planearem a sua vida.
Eco não escreve a sua própria história.
Não vive a sua própria lenda, imita, não sente por si, sente pelos outros, encasula-se numa vida que outros vivem.
Temos todos uma missão.
O nosso corpo é um livro impresso com a nossa história, mas só escrevemos o livro dos outros muitas das vezes imitando-os como Ecos esquecendo-nos da nossa voz interior, daquilo que o corpo pede para ser feito, do destino em nós que deve ser cumprido, como bem dizia Fernando Pessoa.
No nosso corpo jorram no seu interior as águas do conhecimento que permitem a Narciso ver-se a si mesmo em momentos de reflexão, de paz e de silêncios, quando a mente é uma água parada que reflete o céu e a si mesmo.
O que é meu é tudo aquilo que me propus a fazer como propósito de vida, não é, nunca deve ser um seguidismo de Eco atrás de Narciso.
A minha vida é algo meu, é uma identidade, que vem e se vai formando com o conhecimento de mim mesmo, com o que retiro das experiências e da estrada por onde gigantes já passaram.
Esse conhecimento é feito com o meu próprio pensamento, com a minha própria vontade, com a história do meu viver que está no meu olhar para o espelho das reflexões enquanto pergunto às águas paradas do conhecimento:
Quem sou eu?
E muitas outras perguntas existem que se podem fazer a nós mesmos buscando as causas das coisas que nos acontecem, do retirar das lições oriundas das consequências do que fizemos antes.
A construção de Si é o que Universo nos dá todos os dias na nossa voz interior, nas lições que desfilam antes nós pelas estradas dos dias.
Essa construção de Si mesmo, vem da nossa voz interior.
Ela é síntese das lições do que nos acontece todos os dias.
Essa é a bússola que vem dos céus.
Essa bússola aponta para a estrela polar, o nosso destino, o nosso crescimento como almas em busca de mais luz.
A mente fraca é o ser que apenas se repete.
É o ser que não pensa, que não se conhece a si mesmo e que apenas segue a corrente do rio: a multidão, as modas, os desejos desenfreados, as paixões, os vícios de vontade.
A corrente do rio, neste mito, matou Narciso que acabou por se afogar nela.

Narciso, óleo sobre tela atribuído a Caravaggio em 1913. Domínio Público
Narciso afogou-se por usar muito do egoísmo…
Pensou só nele, olhou só para si.
E foi levado pelas águas da corrente, morto pela vida vã.
Esse também não é o caminho.
A voz de Eco, no seu sentido profundo, vem de dentro de nós quando olhamos além das águas que correm dentro de nós mesmos.
E lá, nesse interior de mina, ouvimos o eco dos pensamentos que nos vão dizendo as respostas às perguntas feitas dentro do nosso silêncio.
Elas vão ao fundo das causas, encontram as soluções e fazem o ser mudar exercendo a sua vontade esclarecida feita no tribunal da sua própria consciência.
Quanto mais nos conhecemos menos somos enganados pelo exterior.
Passamos a ouvir a nossa voz interior que nos diz o caminho.
Esse caminho é o mais certo porque é o nosso.
Não é uma repetição do caminho dos outros…
Não é uma imitação do caminho dos outros…
Mitos gregos são lições de verdadeira sabedoria…
Lindas lições de Sabedoria que vêm do fundo dos milénios até hoje de candeia acesa, tal como Diógenes um dia, procurando e interrogando:
Onde está o Homem?
Marco Oliveira
Belo texto, um ótimo convite à reflexão, grato.