O pensamento atual, fortemente influenciado pelo materialismo, inclina-se frequentemente para um constante jogo de contradições. Mas da antiga fórmula de “tese – antítese – síntese”, onde o último termo englobava o melhor dos anteriores da forma mais eclética possível, passou-se para uma irredutibilidade conceptual onde o processo fica pela metade e a análise substituiu a síntese.
Relacionou-se artificiosamente a vocação natural do Homem para a unidade e para a concórdia, com o engano e a incompetência prática. Este mecanismo infra lógico deixa as consciências em perpétuo estado de insatisfação e promove contínuas e vertiginosas mudanças que não oferecem nunca alguma satisfação. Essa insatisfação perpétua, digna de figurar como o pior tormento no Inferno de Dante, e que no classicismo inspirou o mito de Sísifo, é ponderada, desde Lenine em diante, como um motor necessário dos acontecimentos históricos. Pois “acontecimento” é para estas pessoas sempre mudança, como se chegar a um porto seguro não fosse, para um viajante, um “acontecimento” mais feliz que vaguear num desejo que nunca se concretiza.
Assim, o Homem foi esquecido, sepultado pelos interesses de partidos e classes, mais ou menos subjetivas e inconcretas. Uma moderna mitologia, cheia de fantasmas e paraísos, terá substituído na mente dos jovens os caminhos do reto pensar, reto atuar e do reto obter.
Todas as coisas parecem estar em constante contradição; não uma contradição construtiva que leva à harmonia pela oposição, mas a uma contradição destrutiva que exclui e pulveriza o mais débil e o menos numeroso, seja ou não o mais benéfico e necessário. A juventude, mediante uma propaganda constante, foi forçada a pensar assim; ninguém lhe ensinou o contrário. Angústia e progresso tornaram-se irmãos, e a violência selvagem, o único caminho para mudar o mundo. Sim, para “mudar”, pois de melhorar pouco se fala. Identificouse “mudança” com “progresso”, e “desenvolvimento” com “plenitude”.
Assim, o processo fica a meio, eternamente afundado num devir que não chega a nenhuma parte. Não se pode chegar a um lugar seguro quando se excluem termos necessários de conjugação, de plasmação, de plenitude.
Em geral, o idealista despreza a candidez. O seu eterno galopar, a sua marcha incessante sem olhar o caminho não é mais um meio, mas um fim em si. E com pena e sem glória precipitamo-nos todos em direção a um futuro incerto, ficando sem passado e incapazes de viver o presente. A transitoriedade e a instabilidade substituíram tudo. As ideias puras, nobres, bondosas, a inata ternura dos primeiros passos, são vistos como marcos ultrapassados, e a hiperatividade estéril varre com todo o sentimento altruísta, e em nome do “ideal” deixa-se de ser idealista.
A luta cruel e diária pela sobrevivência embotou os sentidos da alma. Esquecemos de sorrir, de viver, de gozar a vida. A ingenuidade foi esmagada pelos cascos do rebanho enlouquecido que corre e corre, sem saber nem sentir outras coisas para além do trovão dos seus próprios passos.
Devemos ser idealistas, sim, mas também devemos continuar a ser cândidos, pelo menos em certa medida. Os preconceitos e os ressentimentos não devem secar os nossos corações. A espiritualidade que propõe a Nova Acrópole é uma espiritualidade de luta, mas também o é de bondade e de paz. De mãos unidas. De ombros juntos.
Nós não aparecemos no horizonte da História apenas para mudar o mundo; viemos, fundamentalmente, para melhorá-lo.
Jorge Ángel Livraga
Extraído do livro Artigos Jornalísticos
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