Muitos são os jogos que Maya põe aparentemente à nossa disposição, até perdermos o significado profundo da vida e nos fazer acreditar, em contrapartida, que todo o valor reside nas formas.

Isto é o que sucede com as pedras. Consideradas até há pouco tempo – e ainda hoje – como elementos inanimados, o homem viu nelas um objeto útil para múltiplas funções.

Desde a pedra que serve para construir casas e templos até à pedra que forma os caminhos, desde a pedra que se converte num utensílio prático para a vida até à pedra que, bem-talhada, é um adorno bonito e eficaz no corpo, todas elas foram consideradas frias e mortas, e dispomos delas como se a vida no-las devesse em vista dos nossos múltiplos trabalhos.

Porém, as pedras estão vivas. Se nos déssemos conta disso, talvez não as utilizássemos. Por isso Maya revestiu a expressão pétrea sob a forma da inércia, ocultando na realidade a lei da resistência mais maravilhosa.

Há corpos que se manifestam pelo crescimento e pela expansão; há outros que o fazem através da resistência. Na verdade, estas duas leis estão presentes em todos os corpos, mas combinadas em diferentes proporções: quando prevalece a lei do crescimento, nós vemos movimento; quando vemos estatismo é porque prima a lei da resistência.

A vontade da pedra consiste em resistir. Ela mantém solidamente unidas as suas moléculas, impedindo que se desagreguem e se dispersem. É então que falamos em “pedras duras”. Com mais resistência, mais dureza. Com mais dureza, mais vontade. Com mais vontade, mais vida.

Diamantes. Pixabay

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Apesar do jogo de Maya e do véu com que faz parecer como mortas as pedras, é fácil entrever a verdade da questão.

Vejamos que as pedras que nos rodeiam não são todas iguais nem da mesma natureza.

Há-as – como dizíamos – mais brandas e mais duras, com menos e com mais vontade de resistir. Há-as mais opacas e mais brilhantes, com maior ou menor capacidade de deixar passar a luz. Há-as mais organizadas e menos organizadas interiormente a tal ponto que as mais organizadas distribuem as suas células de maneira tão matemática que os seus “cristais geométricos” nos maravilham; então falamos de “pedras preciosas”. Há-as que surgem num ponto da terra e as que surgem noutro; umas formam-se em pontos “férteis” da terra, ali onde a energia é maior e mais disponível; outras que se formam em qualquer parte e de qualquer maneira; também entre as pedras há bastardos.

Há pedras cujo destino é simplesmente cumprir a lei dos ciclos, e deixar que o vento as desmorone até se converterem em areia. Há outras cujo destino é curvarem-se docilmente perante as mãos dos homens e imortalizarem-se em obras-primas. Mas a pedra maior que forma parte de uma pirâmide, e a mais fina areia do deserto, gozam da mesma natureza de passiva mas forte resistência.

As pedras formam parte do jogo de Maya, já que elas têm corpo… e nada mais que corpo. Um corpo como o teu e como o meu, embora de diferente conformação. Muito do teu corpo e do meu é de igual substância à dessa pedra que agora nos serve de chão e suporte. Mas enquanto em nós foram despertados outros princípios – psique, mente, algo de espiritual –, na pedra só se manifesta o corpo; os demais princípios estão adormecidos. Estão à espera de novos e distantes tempos em que a inércia cederá, pouco a pouco, lugar ao movimento. Então a pedra crescerá, expandir-se-á e começará para ela uma nova dimensão na eterna ilusão da vida.

As pirâmides de Gizé. Creative Commons

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Quando ouvires dizer que o sol aquece as pedras e dilata-as, detém-te. Observa-as: estão vivas. O mesmo sol que nos alimenta, modifica as pedras.

Quando ouvires dizer que o frio da noite contrai as pedras, não prossigas e pensa: estão vivas, encolhem o seu corpo para suportar a baixa temperatura. Dilatação e contração são os indícios dos que, depois, serão os movimentos do coração.

Também as pedras têm coração. Quando caminhas sobre elas, quando deixas deslizar uma mão sobre a sua superfície, recorda que estás perante um ser vivo que tem a infinita paciência da resistência e da espera.

Recorda os velhos sábios, aqueles que, conhecendo a vida interna das pedras e dos metais, escolhiam as mais apropriadas para fabricar os seus amuletos e talismãs. Recorda os velhos reis e sacerdotes envoltos em joias, que não cumpriam a vazia missão do ornamento, mas uma mais profunda de captação e emissão de energias.

Do mesmo modo que as pedras resistem, elas têm a capacidade de guardar por milhares e milhares de anos a força interna que lhes deu a sua mãe, a terra, e o seu pai, os astros.

Fala com as pedras, brinca com elas. Dar-te-ão uma antiga lição de integridade e força. Falar-te-ão de outros tempos e outros mundos. Dir-te-ão palavras vibrantes que se infiltrarão por entre as suas fendas. Com os teus dedos de pedra, com esses dedos do teu corpo que também é matéria, fala com as pedras.

Delia Steinberg Guzmán
Extraído do livro Os Jogos de Maya. Edições Nova Acrópole

Imagem de destaque: Círculo de Pedra, Escócia. Pixabay