Publicado na revista New Acropolis, número 58, em fevereiro de 1989.

Em muitas oportunidades, já foi dito e escrito que estamos vivendo na Era Tecnológica, sem esquecer de recalcar todas as vantagens que isso supõe.

Todas as atividades estão sistematizadas; a computação eletrónica abrange todos os aspectos da vida; a máquina substitui no dia a dia, a mão-de-obra humana; as comunicações reduzem distâncias e tempo…. Enfim, estamos no ponto de alcançar ao tão sonhado paraíso de um dia, com muitas horas livres e uma semana com vários dias sem trabalho…

Mas entre os muitos paradoxos do momento atual, soma-se mais um, e de importância suficiente para chamar poderosamente a atenção. No mundo da tecnologia, tem-se tentado facilitar todos os aspectos da vida material, mas nada foi feito em benefício da vida psicológica, mental e espiritual; esses mundos subjetivos permanecem tão desorganizados como na época dos trogloditas.

Pode-se objetar que a Psicologia e outras ciências que lhe são auxiliares, têm catalogado o homem em diferentes tipologias, facilitando assim o seu reconhecimento e, no caso de doença, o seu tratamento. Isto é verdade; mas catalogar tipos humanos em bons livros e gráficos não resolve o problema prático dos seres humanos indefesos perante si mesmos. Saber que se é tímido não equivale a curar a timidez; saber que se tem uma fantasia desbordada também não a controla.

Hoje, um homem pode operar uma enorme diversidade de máquinas, mas é incapaz de manejar a depressão psicológica, ou de moderar os seus instintos, refrear a ira, despertar a sua espiritualidade. E não é que não queira fazer estas coisas; muitas vezes desejaria fazê-lo, mas não pode. Não sabe como fazê-lo. A tecnologia não se tem interessado por esses problemas, nem tem sido capaz de idear nenhum sistema que permita trabalhar com esses imponderáveis ​​subjetivos do homem interior.

Os seres humanos muitas vezes vivem em família criando complexas estruturas sociais e abrigos artificiais. Domínio Público.

Como resultado, enquanto a ciência e a tecnologia avançam de mãos dadas, projetando cada vez mais longe as possibilidades de conforto material, o homem submerge-se cada vez mais fundo no desespero de seu eu insatisfeito. Quanto mais horas livres tem, mais medo sente de si mesmo, pois não se conhece, nem sabe estar a sós consigo mesmo, nem entende as forças escondidas daquele estranho companheiro com quem vive diariamente, sem chegar jamais a conviver com ele.

As máquinas, longe de prestar o verdadeiro serviço para o qual foram planeadas, têm usurpado os poderes humanos; têm escravizado o homem que pretendiam libertar. Já quase não se concebe a vida sem relógios, telefones, mil aparelhos elétricos, ascensores, escadas rolantes, televisões e escovas de dentes automáticas. E o homem encolhe-se, inútil diante da própria tecnologia que tem criado.

Fala-se na sistematização de dados, mas não se pode organizar a vida interior. Fala-se em combater a poluição, mas não podemos evitar os maus pensamentos e sentimentos. Fala-se em aeronaves supersónicas, mas não se pode acelerar a compreensão mental. Fala-se de paz e amor, e de direitos humanos, mas não se sabe amar, nem viver em paz, nem se concebem os direitos humanos, pela singela razão de que tampouco se concebe o homem.

Tecnologia? Libertação? Domínio da vida?

Deixemo-nos de paradoxos e saibamos de uma vez por todas, que somente um homem especialista no difícil e maravilhoso conhecimento de si mesmo, pode dar valor à Vida e à Liberdade, e pode fazer uso da ciência e da tecnologia em benefício da humanidade.

Desde estas páginas da Nova Acrópole, convidamos a iniciar a Nova Era da antiga ciência do Conhece a ti mesmo.

Delia Steinberg Guzmán

Publicado na biblioteca Nueva Acrópolis, em 10 de fevereiro de 2025

Imagem de destaque: Representação dos Metadados. Creative Commons.