No panorama humano do nosso novo milénio, parece necessária uma revolução para o positivo. Uma revolução que envolva diferentes gerações e que a sustente no tempo, capaz de semear uma ética profunda e de colher no futuro, frutos mais conformes à dignidade humana do que os oferecidos pelo nosso presente. O futuro é sempre incerto. A única coisa certa é que ele é condicionado pelo passado.
Desde a China antiga, com os pensadores da era pré-Han (séculos V-III a.C.), o conceito de revolução foi definido como mudança violenta. No pensamento de Confúcio, o conceito implicava uma transformação do espaço e, mais tarde, ao abranger também o tempo, chegamos à revolução sem tempo, da qual Mao Tsé-Tung teria esboçado alguns elementos e que Ho Chi Ming (aquele que ilumina) teria expressado melhor. Trata-se de fazer com que a revolução não se limite a um lugar, mas seja transferida para muitos outros lugares com a participação de diferentes gerações que prolongam o seu tempo de vida. E hoje, no dealbar do século XXI, volta-se a falar de revolução: social, política, económica, artística, etc., mas num ambiente bastante obscurecido e confuso.
O que é que aconteceu ao nosso século XX?
De um ponto de vista filosófico, uma verdadeira re-evolução é fazer a evolução correr outra vez, fazer o estagnado mover-se de novo. E a grande questão é: teremos estagnado?
Tudo parece indicar que sim. É inegável que o século XX foi um avanço no terreno da tecnologia. Os avanços científicos, médicos, psicológicos e outros foram tremendos. Mas os grandes cérebros foram utilizados para a guerra, para criar armas de destruição massiva; os conhecimentos do condicionamento clássico e do behaviorismo são utilizados para manipular o comportamento e o pensamento dos seres humanos, e.… a verdade é que não alcançámos um verdadeiro avanço humano. Fizemos um progresso técnico, mecânico, e nesse progresso material perdemos muita da nossa metafísica, muita da nossa espiritualidade.

Originais da Convenção de Genebra, Kevin Quinn. Creative Commons
O século XX foi um século teórico, aparentemente cheio de boas intenções: foi fundada a ONU, estabelecemos acordos na Convenção de Genebra, foi promulgada a Declaração Universal dos Direitos do Homem e muitas outras organizações e acordos viram a luz do dia. Mas as guerras continuam, o tratamento humilhante dos prisioneiros de guerra prossegue, muitos civis inocentes continuam a morrer nos conflitos armados, o trabalho infantil é uma realidade em muitos países, há fomes e pestes… e, infelizmente, a verdade é que as dez pessoas mais ricas do mundo acumulam o que é necessário para os mais de um bilião e meio de seres humanos que se encontram na pobreza. E, apesar dos esforços das democracias, a chave continua a ser o fator humano e não tanto os sistemas.
O que é necessário?
O século XXI terá de considerar que os valores democráticos devem ser sustentados pela sua implantação individual em cada cidadão.
Precisamos de educação e de ética. Uma educação que ofereça as máximas possibilidades de crescimento e desenvolvimento a qualquer ser humano, e que tire partido das maiores potencialidades de cada indivíduo. Uma nova ética que facilite o retorno da espiritualidade, que nos ajude a nos relacionarmos com a natureza e que valorize o coração dos seres humanos. Uma nova ética que nos aproxime dos valores intemporais da estética, longe, finalmente, do mercantilismo e da superficialidade.

A Justiça de Luca Giordano (1684-86), Palazzo Medici Riccardi, Florença, 1684-1686. Domínio Público
E algo fundamental seria que prevalecesse o sentido de justiça, que é, afinal, o verdadeiro motor de qualquer Revolução. Da mesma forma, parece que o motor individual para a superação de qualquer tipo de crise se encontra numa ética profunda.
Assim, fazem todo o sentido as palavras do Professor Jorge Angel Livraga, quando escreveu sobre as crises que afetam o ser humano:
Levantemos o olhar (é uma forma de elevar a consciência), porque há coisas muito mais importantes: o destino histórico da humanidade, o rio de almas que continua a avançar, rumo a esse misterioso vórtice a que chamamos morte, onde algo nos espera.
Carlos Adelantado Puchal
Publicado na Revista Esfinge em 30 de junho de 2014
Imagem de destaque: Efeitos do Bom Governo na Cidade, de Ambrogio Lorenzetti (1290-1348). Domínio Público
Situação muito complexa e de evolução muito instável e imprevisível. Há muitos vectores em presença a ser considerados, muitas e diversas forças que se movimentam e não se descortina uma resultante . Parece haver uma grande instabilidade nos vectores humanos e nos fenómenos naturais. É claro que sempre existiram cataclismos, incêndios, guerras terríveis, dizimação de povos, invasões sistemáticas e horrores humanos. Estamos numa época especial ou tão somente a reproduzir modelos que a História regista. Não nos podemos esquecer que tendemos a valorizar, para o bem e para o mal,para o menor e o maior, aquilo que estamos a viver,como se o “nosso ” tempo, ou seja, o tempo que estamos a viver fosse “especial”- e especial porque o estamos a viver, esquecendo as brumas , muitas delas tenebrosas, do passado histórico. A nossa tendência antropomórfica, a nossa tendência para valorizarmos excessivamente o que vemos e ouvimos e apara desvalorizar o que não vemos e ouvimos é gritante. Há que ter muito cuidado nas nossas “grandes” análises.