Gostaria de começar este artigo com uma pergunta que me parece fundamental para abrir um caminho de reflexão fora das ideias que quotidianamente julgamos certas e que condicionam o nosso modo de olhar o mundo em redor: O que é real? Talvez a resposta mais imediata seja que a realidade é o que podemos ver e tocar.

Tal como Platão e tantos outros filósofos diziam, e a ciência atual confirma, nada mais errado do que uma visão materialista da realidade: nós não vemos, verdadeiramente, as coisas mas sim a luz nelas refletida nem tão pouco tocamos a matéria, já que a sensação de tato não é mais do que a força de repulsão electroestática. Como diz o Dr. Sérgio Felipe de Oliveira, “há que ter muita fé para crer no materialismo”. Isso leva-nos necessariamente a uma outra ideia errada, que é o de pensar que a ciência, e naturalmente a postura científica, tem de ser uma postura materialista. Isto não é de modo algum verdade, pois o materialismo é simplesmente a opinião pessoal de determinados cientistas e não da Ciência.

A perspetiva materialista distanciou-se de uma visão mais global ao banir a pergunta do “porquê?”, preferindo dedicar-se exclusivamente à pergunta do “como?”, vedando para si mesma a dimensão da significação. Não nos pode surpreender por isso que olhe para um mundo que parece estranho e sem finalidades… e sem sentido para os valores. A vida passou a ser vista como insignificante num mundo acidental. Estes limites que a visão materialista colocou ao conhecimento transformaram-se nas limitações da ciência materialista:

“Pessoalmente estou mais convencido do que nunca que o principal inimigo do progresso científico é rejeitar e recusar estudar de antemão e livre de preconceitos factos aparentes, incompreensíveis ou estranhos.”
Dr. Van Eeden, 1890

A substituição da mente pelo cérebro

Cérebro. Pixabay

O materialismo científico tem vindo a decretar a morte da mente. Aos poucos, o conceito de “mente” foi sendo substituído pelo de “cérebro”, acreditando-se que a mente não existe como uma entidade separada, mas que constitui meramente um estado do cérebro, causada tão-somente por neurónios e neuroquímica, como uma “excreção” do cérebro, tal como o descreve o neuropsicólogo Barry Beyesstein:

“Assim como os rins produzem urina, o cérebro produz a consciência.”

Deste modo todas as questões da natureza humana, as suas inquietações, as produções artísticas, filosóficas, etc. deixaram de fazer qualquer sentido, pois passaram a ser apenas um produto cerebral:

“Nós, cientistas, podemos começar a explorar todas as questões que os filósofos têm vindo a estudar há milénios, usando a imagiologia cerebral, estudando os doentes e fazendo as perguntas certas.”
V. S. Ramachandran, Univ. Califórnia

A neurociência, com o grande avanço sobre a compreensão da mecânica do cérebro, apoia-se inequivocamente no dogma do materialismo como base da sua investigação, partindo da premissa de não poder existir nenhuma forma de consciência que não seja a partir de processos do cérebro.

A capacidade de descrevermos determinados centros de atividade do cérebro e atribuir a essas áreas determinadas funções ou atividades pode apenas explicar-nos o que está a ocorrer, mas não por que ocorre e que causas põem estes processos em movimento, ou seja, simplesmente mede (e de maneira indireta!), sinalizando onde há uma maior necessidade energética entre centenas de milhares de neurónios. A ativação neuronal mostra-nos apenas o uso de estruturas. É como um rádio: pode ser ativado ligando-o, sintonizando num certo comprimento de onda, mas não é possível influenciar o conteúdo do programa que se vai ouvir.

“Observando o bailado de luzes que piscam num aparelho de ressonância magnética, é possível seguir o rasto dos pensamentos que se deslocam no interior do cérebro. É o mesmo que poder ver o interior de um relógio a trabalhar.”
Michio Kaku

Não podemos, no entanto, concluir a partir daí que os pensamentos são produto do cérebro, seria o mesmo que concluirmos que a eletricidade que corre nos fios elétricos é produzida pelos fios. A analogia que Michio Kaku faz com o relógio leva-nos a um pensamento de um sábio africano que diz:

“O homem construiu o relógio, deus construiu o tempo.”

Pesquisas realizadas por Karl Lahley ao longo de 30 anos, para perceber se as funções e determinadas memórias eram produzidas por determinadas zonas do cérebro, consistiam em remover a maior parte do córtex motor dos macacos depois de terem sido treinados para abrir caixas com vários fechos. Embora esta operação tivesse como resultado uma paralisia temporária, ao fim de oito a doze semanas eles recuperavam o suficiente para serem capazes de fazer os movimentos necessários para abrir os fechos das caixas. Lashley mostrou que hábitos já adquiridos continuavam a ser retidos, mesmo se as áreas de associação do cérebro fossem destruídas.

Muitas outras observações sobre a sobrevivência de hábitos aprendidos depois da destruição de várias partes do cérebro conduziram à conclusão de que “a memória está ao mesmo tempo em todo o lado e em lado nenhum em particular”. Se uma porção do córtex sensorial for ferida, o “mapa” sensorial apropriado da região ferida pode ser transferido para uma região próxima (se bem que, por vezes, com alguma perda de acuidade), restabelecendo-se novas conexões neuronais e podendo ocorrer o nascimento de novos neurónios. Assim, se as funções que são atribuídas a uma determinada zona passam a fazer-se noutra, então isso naturalmente significa que a função (ou a sua causa) é “independente” da estrutura mas antes que a função utiliza a estrutura.

Esta neuroplasticidade tem implicações naturalmente no que se refere aos mapas cerebrais, isto é, de que estes “não são imutáveis dentro de um só cérebro e nem tão pouco universais”. O cérebro é um sistema dinâmico e não-linear, em que os “mapas” podem variar constantemente dependendo do que realizamos e pensamos ao longo das nossas vidas. Tal como explicou G. Boring: “o mapa de um dia deixaria de ser válido no seguinte”.

Curiosamente, e no momento em que escrevo este artigo, investigadores da Fundação Champalimaud em Portugal descobriram que a morte de neurónios com funcionamento débil traz vantagens para os processos de memória, funcionando muito melhor um cérebro cujos neurónios “velhos” morrem do que um cérebro em que permaneçam vivos. Pois isto vem contrariar em absoluto a visão da consciência produzida pelo cérebro pois, se assim fosse, a consciência seria então sempre superior mesmo com neurónios a funcionar debilmente do que não os tendo. Por outro lado, fará talvez todo o sentido pensarmos antes na consciência como “extra cerebral” e que consegue melhor projetar-se num tecido isento de elementos que bloqueiam a receção da informação pelo seu mau funcionamento. Talvez seja, pois, uma descoberta que nos trará novas discussões na abertura de outros caminhos.

Afinal não somos humanos!…

Seres Humanos. Wikimedia Commons

A abordagem materialista das neurociências pretende caracterizar aspetos da condição humana mediante o processamento de imagens cerebrais que retratam o pensamento, os estados emocionais, os juízos morais… tendo por fundamento que os processos mentais relacionados com a nossa conduta e juízos morais são propriedades emergentes da atividade cerebral, ou seja, que a mente é um estado funcional do cérebro.

A este propósito diz o prof. Klaus Lüderssen:

“Os resultados da investigação cerebral podem ser realmente dramáticos… Se todos os resultados do comportamento são eventos puramente físicos e químicos ocorridos no cérebro – portanto sujeitos às leis deterministas de processos neuroelétricos e neuroquímicos e a impossível influência da vontade – cada ação contrária ao Direito teria que ser tratada como um ato involuntário.”

A psiquiatra e escritora americana Sally Satel, co-autora do livro “Lavagem cerebral: o apelo sedutor da ‘neurociência’ insensata”, explica que os exageros de uma posição que chama de “neurocêntrica” podem mais atrapalhar que ajudar.

“Essa visão da mente tem o potencial de minar as nossas ideias mais arraigadas sobre individualidade, livre arbítrio e responsabilidade pessoal, colocando-nos sob o risco de cometer erros graves, seja nos tribunais, nas salas de interrogatório ou nas clínicas de tratamento de dependência química.”

Esta visão “cerebral” da consciência humana explica que a felicidade humana é uma questão de química cerebral… Se assim fosse, com as toneladas de químicos vendidos anualmente para repor as “descompensações” químicas, teríamos naturalmente um mundo de seres humanos irradiando felicidade, quando a única felicidade que estes fármacos causam é a da indústria farmacêutica.

Na década de 1990, imagens funcionais indicaram que o transtorno obsessivo-compulsivo gerava mudanças na configuração do cérebro. Nesse mesmo estudo, os investigadores constataram que, depois de um tempo de tratamento, não só os pacientes que tomaram medicamentos, mas também aqueles que só fizeram terapia comportamental, sofreram novas modificações cerebrais – o órgão voltou a comportar-se como o de pessoas saudáveis, percebendo-se que o modo de pensamento altera o funcionamento cerebral:

“Da mesma forma que o cérebro altera a mente, a mente altera o cérebro.”
Moreira Almeida

A observação do cérebro como produtor do pensamento ou da consciência é tão simplista quanto o acharíamos em relação a alguém que considerasse que as imagens de um filme que vemos num ecrã de televisão fossem produzidas por puro capricho do aparelho. Podemos, pois, pensar num modelo de relação entre consciência e cérebro semelhante aos modernos sistemas de comunicações: Existe mundialmente uma troca contínua de informações por meio de campos eletromagnéticos via rádio, TV, telemóveis e computadores e que nos envolvem constantemente. No entanto só nos apercebemos desses campos eletromagnéticos informativos quando usamos o telemóvel, ligamos o rádio ou a televisão. A informação recebida não se encontra dentro desses equipamentos nem nos respetivos componentes, mas torna-se percetível mediante a capacidade de receção dos aparelhos. Quando desligamos a televisão a receção cessa, mas a transmissão continua a fazer-se: não desapareceu e ainda poderá ser recebida usando um outro recetor.

É de algum modo ingénuo pensar que, pelo facto de termos conhecimento, por mais exaustivo que seja, do funcionamento e relações neuronais, vamos conseguir compreender toda a complexidade da nossa condição humana. Experiências realizadas com indivíduos que foram expostos a estímulos visuais vários, como comida, imagens eróticas, etc., não obstante primariamente serem ativadas as zonas do cérebro correspondentes aos estímulos, foi atingida, através do esforço de vontade individual, a alteração desses estímulos no cérebro, o que demonstra claramente que existem processos mentais ou de consciência que modificam a resposta “automática” cerebral e que não são iniciados por um mecanismo neuronal.

Linhas não materialistas das neurociências

Consciência. Public Domain

Sendo a linha materialista a que mais conduz a investigação científica e a que se encontra nos meios de difusão da ciência, é normal que todos tenhamos conhecimento dos precursores do moderno materialismo científico como Darwin, Marx e Freud, que deram base e impulsionaram as teorias que tomam como paradigma a consciência simplesmente como um “subproduto” da atividade do cérebro, e desta forma se justifica a opinião geral do “cientificamente provado”. Seria no entanto interessante conhecermos as teorias de cientistas como F. C. S. Schiller, William James e Henri Bergson, para os quais a consciência não é produzida pelo cérebro, mas sim transmitida através do cérebro, funcionando este como um filtro que só permite a passagem de determinados tipos de consciência, como por exemplo afirma Beauregard M.:

“A mente existe e usa o cérebro, mas não é a mesma coisa que o cérebro.”

Este campo de pesquisa tem contribuído para a compreensão de uma mente imaterial e separada do corpo, mas que ao mesmo tempo é capaz de controlá-lo por meio da dinâmica eletroquímica do cérebro e usar, por sua vez, as informações recolhidas pelos sistemas sensoriais disponíveis. Nesta teoria transmissiva alguns destes autores encaixam os factos que a teoria materialista classificou como sobrenaturais, como processos da consciência desligados do cérebro.

Um estudo norte-americano de 2013, veio provar que o ato de observar um objeto quotidiano influenciaria as suas propriedades. Devido ao facto de o objeto quântico ser extremamente reativo ao ato de observação, essa sensibilidade será constatada sempre que um objeto quântico for medido, afirmam os autores. O ato de medir a sensibilidade de um objeto faz com que o comportamento das ondas quânticas mude o comportamento das partículas. Os autores salientam que foram realizados três experiências: duas em que as pessoas tentaram influenciar objetos mentalmente no seu laboratório, e um envolvendo um teste semelhante realizado online. Todas as três experiências mostraram resultados positivos a essa influência.

A física quântica apresenta assim um modelo diferente da relação da consciência e do cérebro: A nossa consciência completa e indivisa com memórias expressivas encontra a sua origem e está arquivada no “espaço fásico” e o cérebro apenas serve como estação de trânsito para parte da nossa consciência e das memórias serem acolhidas na nossa “consciência desperta”. Durante a nossa vida, a nossa consciência manifesta-se por vezes como “ondas” e outas como “partículas”, ou seja, por vezes encontra-se numa dimensão liberta da dimensão material do cérebro (“ondas”) e outras e existe limitada na dimensão material cerebral (“partícula”), existindo uma permanente interação entre estes dois aspetos da consciência. Quando morremos, a nossa consciência deixa de ter um aspeto de “partículas”, mas permanece apenas sob o aspeto de “ondas”, o interface entre a nossa consciência e o nosso corpo é eliminado, sendo desta forma as funções das redes neuronais encaradas como recetores e transmissores de consciência e de memória, e não como reservas das mesmas.

Campos de investigação vedados à ciência materialista

O vôo da alma, Louis Janmot. Wikimedia Commons

Segundo o ponto de vista materialista, qualquer discussão sobre consciência é essencialmente uma discussão sobre circuitos de computador… esquecendo-se de que alguém construiu o computador, o programou e lhe fornece os dados. Quaisquer contraexemplos como experiências “fora do corpo”, experiências de “quase morte” (EQM) e outros são considerados sintomas de patologias, alucinações ou imaginação… e dessa forma se afasta toda a perturbação que podem causar aos pilares inamovíveis da ciência materialista e se ridiculariza o esforço de muitos cientistas que, de forma séria, se têm empenhado na investigação para realmente se poder compreender a consciência.

Desde os anos setenta do século XX, têm-se vindo a fazer estudos sobre os relatos de EQM. Estes estudos permitiram concluir que cerca de 4 a 5% da população total do mundo ocidental terá passado por uma EQM. Estes estudos têm contribuído em muito para uma visão sobre a compreensão da natureza da consciência.

O Dr. Pim van Lommel, do Hospital Rijnstate na Holanda realizou um dos estudos mais exaustivos sobre EQM, cujos resultados foram publicados na revista “Lancet” em 2001 com dados e conclusões extremamente importantes. Nesse estudo o Dr. Pim van Lommel refere que de acordo com os conceitos atuais, não é possível ter a consciência desperta durante uma paragem cardíaca, quando não há respiração nem circulação sanguínea. No entanto, aqueles que viveram uma EQM, em inconsciência causada por anorexia cerebral devido a paragem respiratória e circulação sanguínea, relatam que tiveram conhecimento consciente com memórias, emoções e a perceção de se encontrarem fora e acima do seu corpo, de terem “visto” enfermeiros médicos e pessoas de família dentro e fora da unidade de cuidados intensivos. Refere ainda:

“No caso de paragens cardíacas de mais de 37 seg. a atividade eletroencefalográfica normal pode não se restabelecer durante longos minutos ou horas depois de as funções cardíacas se terem normalizado, dependendo da duração da paragem cardíaca… a recuperação de encefalograma subestima a recuperação metabólica do cérebro, e a assimilação de oxigénio pode permanecer diminuta por tempo considerável depois da recuperação circulatória.(…) Um cérebro nessas condições seria aproximadamente como um computador com a ficha desligada da corrente.”

A questão que coloca é se será que a morte do cérebro é mesmo “mortal”, ou será que não passa do começo de um processo de morte que pode durar horas ou dias? E o que acontece à consciência durante esse período?

Ao contrário do que seria espectável, durante a EQM as perceções de consciência encontram-se num grau mais elevado do que aquele que é normal durante o funcionamento corpóreo em estado de vigília. Durante um período de circulação cerebral danificada, em que são paralisadas e danificadas estruturas cerebrais, existe uma perceção intensamente lúcida, assim como estão ativos todos os processos de pensamento lógico e existe um elevado grau cognitivo. Como é possível que a consciência nítida relativa a factos ocorridos fora do corpo possa ser experimentada no momento em que o cérebro já não se encontra em funcionamento, em período de morte clínica, mesmo com registo nulo de encefalograma? Mais incrível é que mesmo doentes cegos descreveram perceções visuais durante as EQM!

Uma das vivências mais relatadas durante a EQM é a análise de toda a sua vida “rapidamente”; o tempo e o espaço parecem não existir durante uma tal experiência. Onde se encontra então toda a memória, se durante esse período o cérebro se encontra “desligado”? Simon Berkovitch calculou que o cérebro tem uma absoluta incapacidade para produzir e armazenar todos os processos informativos de todas as nossas memórias, como os pensamentos de uma vida inteira. Necessitaríamos de 1024 operações por segundo, o que é impossível para os nossos neurónios. Quando as funções do cérebro se perdem, tal como nas EQM, as memórias e a consciência ainda existem, mas a capacidade recetora por parte do cérebro perdeu-se e a ligação interrompe-se. Por isso, conclui o Dr. Pim van Lommel, “na minha opinião a consciência não está radicada no nosso corpo físico!”

As EQM demonstram que durante esse período a consciência esteve disponível independentemente do funcionamento do cérebro.

“Deveríamos concluir finalmente a possibilidade de que a morte, como o nascimento, não passará de uma simples passagem de um estado da consciência para outro. Podemos também concluir que a nossa consciência desperta, aquela que dispomos no nosso dia-a-dia, não é senão uma parcela de uma nossa consciência total e indivisa.”
Dr. Pim van Lommel

Longe de ter uma pretensão científica e de fazer uma abordagem exaustiva de uma enorme quantidade de questões que o tema levanta, se este artigo conseguir ser um pequeno contributo de reflexão sobre outros possíveis ângulos de abordagem da relação consciência-cérebro, já terá alcançado os seus objectivos! Ao contrário do que é habitual, que é o confronto entre perspetivas, que para que alguma vença é necessário que se tornem duras, inflexíveis e dogmáticas, penso que o que há a fazer é perceber desde que ângulo se observa a questão e, juntando esses ângulos (e sabendo-os enquadrar dentro de uma visão global), dar-lhes o verdadeiro significado. Hoje vivemos, muito provavelmente, o período da história da humanidade em que possuímos os melhores meios de observação do universo, desde o plano macro ao micro, e isso constituí uma vantagem muito significativa. Mas, por outro lado talvez, essa capacidade tenha criado um deslumbramento em que nos fixamos exclusivamente no que vemos, atrofiando assim a nossa capacidade de pensar mais além. A imagem que Platão nos deixou no seu Mito da Caverna ilustra bem toda esta problemática. Basta imaginarmos o cérebro como a parede da caverna onde se projetam as sombras, a fogueira e objetos que projetam as sombras a nossa consciência e a realidade fora da caverna a nossa supraconsciência ou consciência espiritual, talvez nos ajude a perceber toda esta relação.

A Caverna de Platão. Wikimedia Commons

Tal como no Mito, se observamos exclusivamente as sombras, estas parecem-nos reais e a única realidade, e hoje temos capacidade de as descrever com muito pormenor: a velocidade a que se deslocam, a sua definição, textura e tantos outros elementos que assim lhes conseguimos dar tanta realidade e simultaneamente ter tanto trabalho de descrevê-las que já nos deixam bem “entretidos”, tal como a complexidade que constitui a descrição de todos os processos que se dão no nosso cérebro. No entanto, se conseguimos olhar para trás nesta caverna, veremos que afinal existe uma outra realidade que causa essas sombras, uma fogueira e objetos que estão na sua origem, do mesmo modo que a nossa consciência e as suas conceções mentais vão criando as suas projeções no cérebro para atuarem no mundo físico. Quando percebermos essa outra realidade, ou essa consciência por trás dos fenómenos cerebrais, então talvez nos deparemos com uma outra realidade ainda maior, uma supraconsciência ou uma consciência espiritual ainda muito mais real. Esse é o nosso grande desafio científico atual: dar o salto da observação e do conhecimento do funcionamento da matéria para a compreensão das causas profundas que a movem.

José Ramos